sábado, fevereiro 25, 2006

ANTESTREIA DA SEMANA



Afigurando-se como a nova moda cinematográfica do momento, os pinguins voltam a ter um filme inteiramente dedicado à sua natureza. Depois dos scene stealers de MADAGÁSCAR (2005) e das emoções de A MARCHA DO IMPERADOR (2005), chega-nos agora HAPPY FEET, uma proposta de animação da Village Roadshow Pictures.

O teaser trailer já se encontra disponível, e não ficam dúvidas de se tratar de uma obra fresca, tal como o cenário onde a história se desenrola. A reter o excelente elenco de vozes: Elijah Wood, Hugh Jackman, Nicole Kidman, Hugo Weaving e, até, Robin Williams!

A estreia, nos EUA, está prevista para Novembro de 2006.

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

CURIOSIDADE DA SEMANA



Enquanto procurava informações sobre o próximo trabalho de Brian De Palma, THE BLACK DAHLIA, eis que encontro por acaso um outro filme, exactamente com o mesmo nome e em produção desde 2005 (segundo o IMDB), que se afigura, para mim, como uma curiosidade da primeira ordem.

Realizado por um desconhecido (Ramzi Abed) e interpretado por outros tantos desconhecidos (uns tais Kristen Kerr, Lizzy Strain, Trent Haaga,...), o trailer permite vislumbrar uma obra de tons quase amadores e, no entanto, capaz de criar autêntico suspense, ao nível dos melhores policiais negros de Hollywood.

A página oficial está muito bem construída; apesar de imperar o já referido amadorismo, é uma prova viva do poder — e real potencial — da Internet, de uma ou outra camcorder digital e de muita imaginação e força de vontade.

Em jeito de conclusão, e pelo que pude ler, o argumento é muito similar ao realizado por De Palma. Trata-se de uma representação contemporânea da lenda da Black Dahlia, actriz assassinada em 1947 e cujos contornos da sua morte nunca foram tornados claros.

Vejam por vós mesmos e digam se não valerá a pena ter este título em linha de conta.

domingo, fevereiro 19, 2006

IMORTAL (2004), de Enki Bilal



O melhor exemplo de "filme-híbrido" que só a tecnologia digital poderia criar, IMORTAL é a soma de ciberpunk, Art Deco e mitologia egípcia cujo produto final resulta numa das obras mais originais e mais falhadas do seu género.

Adaptado da banda desenhada de Enki Bilal, nomeadamente de «La Foire aux immortels» e «La Femme piège» (integrantes da trilogia Nikopol), IMORTAL mostra-nos uma Nova Iorque no ano 2095, na qual humanos e criaturas artificiais vivem lado a lado, o trânsito é controlado por uma extensa rede de cabos eléctricos e o céu é visitado por uma pirâmide gigante — o meio de transporte de uma figura alada, corpo de homem e cabeça de águia, baptizada de Hórus e que chega à cidade para ser julgado pelos outros deuses. O seu caminho cruza-se com Nikopol (Thomas Kretschmann), obrigado a ceder o seu corpo nas alturas mais convenientes à divindade. Por outras palavras, está em causa o intuito de Hórus conceber um filho humano, e a escolhida é Jill (Linda Hardy, ex-Miss França), uma misteriosa rebelde neste mundo utópico.



Parece confuso? É mesmo. Apesar da beleza visual do filme (isso é inegável), há que ter em mente o facto de se tratar de uma adaptação de BD, meio que ainda não conseguiu encontrar a sua eficaz correspondência com o cinema — apesar da "transladação" eficaz patenteada em SIN CITY (2004). Este estilo de adaptações implica, na maioria dos casos, uma perda substancial do simbolismo da história, e a trilogia de Bilal (cujos volumes já tive o privilégio de observar) sofreu com a mudança de meio artístico. O formato original de banda desenhada vive, sobretudo, da associação entre as parcas esperanças do futuro da Humanidade e a herança do passado, ainda que mitológica, como forma de reflectir sobre o presente. Neste caso, IMORTAL apenas efectua um voo rasante nessa simbologia, deixando-nos com uma produção claramente oca em termos narrativos (um exemplo máximo é a personagem Jill, cujos motivos para os seus comportamentos e obrigatoriedades nunca são esclarecidos). Nem a presença do autor da banda desenhada na cadeira de realizador anula essa impressão: o filme demora muito a descolar, situação causada pela obrigatoriedade de localizar o espectador não familiarizado com a história, e quando a acção principal arranca, permanece a sensação de estarmos a ver outro filme e outro argumento, mas com os mesmos protagonistas.

Apesar disto, não é uma hora e meia mal gasta. O cinema de alta definição veio para ficar, e a IMORTAL já não fugirá a honra de ser um dos primeiros panteões a explorar esta nova vertente. O seu a seu dono... E ainda nos é concedido o "bombom" de avaliar Charlotte Rampling no papel mais "radical" da sua carreira.



quinta-feira, fevereiro 16, 2006

MÁQUINA ZERO (2005), de Sam Mendes



A figura do Marine (ou fuzileiro norte-americano, se preferirem) constitui uma presença marcante do panorama cinematográfico dos EUA. Durante mais de cinco décadas de filmes de guerra, pudemos acompanhar o horror, o sofrimento e a angústia do soldado nos campos de batalha, e o incremento do realismo sensorial, neste género de película, proporcionado pela abundância de projécteis, sangue e fumo, tem contribuindo para o aumento da excitação dos espectadores durante a sua projecção.

Perante este cenário, é então que surge este MÁQUINA ZERO (JARHEAD, no original), uma espécie de objecto não-identificado na história do cinema bélico, e que, para o qual, não sou capaz de recordar outro título homónimo no que se refere à similaridade de temática. É um facto que conseguimos sentir o tal horror, sofrimento e angústia do soldado — no presente caso, durante a Guerra do Golfo, em 1990; contudo, nunca testemunhamos uma única sequência de batalha que justifique esses estados de espírito. Este é um filme que aborda a faceta do indivíduo treinado e manipulado para a guerra, chamado a cumprir serviço num conflito de grande escala e, quando a rendição dos vencidos é consumada, conforma-se com a realidade de nunca ter desfrutado da oportunidade de aplicar, na prática, todo o "frenesim assassino" que lhe foi incutido pelo sargento de instrução. MÁQUINA ZERO é, portanto, a descrição do tédio e do stress de soldados destacados para o deserto (onde permanecem durante mais de 170 dias sem "cheirar" o desenrolar dos acontecimentos), sofrendo as consequências negativas da imobilidade, presenciando os rastos de quem realmente disputou o conflito armado e arrecandando os traumas impostos pelos próprios defeitos humanos em contexto de guerra.



Anthony Swofford (Jake Gyllenhall) ingressa nos Marines — apesar do seu real intento de enveredar por uma carreira universitária — e, terminado o período de recruta, é alistado para, nas palavras do seu tenente-coronel Kazinski (Chris Cooper), «defender os poços de petróleos dos nossos amigos sauditas das investidas iraquianas». Apesar dos elevados níveis de sede de combate, os soldados nunca são chamados à real action. Ao invés, passam os dias ocupados em lúdicas e repetidas actividades, tais como: desmontar, limpar e voltar a montar a arma; partilhar históras de aventuras sexuais; masturbação; organizar combates de escorpiões, entre outras. E, quando são, finalmente, impelidos a agir, a burocracia e o desejo de uma rápida conclusão para a campanha militar frustram as suas hipóteses de, no mínimo, pressionar o gatilho. Essa frustração, mesmo com a passagem dos anos, nunca se desvanece. Tal como Swofford afirma no melodramático final, «Continuamos todos no deserto».

No cômputo geral, MÁQUINA ZERO é um filme ambíguo em vários aspectos, o que resulta numa árdua "catalogação" do mesmo. Não se trata de um panfleto anti-guerra, apesar das várias sequências que denunciam os infames danos colaterais de um conflito bélico; não é uma arma apontada à política mundial norte-americana, embora o tom de acusação seja, a espaços, bastante evidente; também não estamos perante um drama de guerra, semelhante ao excelente A BARREIRA INVISÍVEL (1998, Terrence Malick), não obstante a imensa densidade psicológica da narrativa; poderia, inclusive, pensar-se que este é um filme sobre a loucura da guerra, mas a vertigem da insanidade raramente surge nos procedimentos. Com tanta ambiguidade, é legítimo considerar MÁQUINA ZERO como uma obra onde predomina o vazio e a incoerência. Bem pelo contrário, é um produto constituído por várias camadas, cada uma perfeitamente sustentável e receptiva à interpretação que se quiser formular.



A interpretação que mais me ocorrre é apenas esta: Sam Mendes concebeu um mosaico de dramas humanos individuais — começando pelos do protagonista até aos das personagens secundárias — preponderados pelas características intrínsecas ao Homem, conduzidas ao extremo pelas condições extremas em que se encontram. Será redutor descrever o filme desta maneira, mas é esta a mensagem que mais transpira da bobina. E a subtileza das referências culturais utilizadas nesta obra aponta, claramente, nesse sentido: a sequência da projecção de APOCALYPSE NOW (1979, Francis Ford Coppola), nomeadamente a cena do ataque à aldeia, está carregada da mesma intensidade e anseio demonstrado pelos soldados que a assistem — isto é, a presença fulgurante dos sentimentos humanos mais inatos — e ainda é possível observar o acréscimo de motivos subjectivos — o poder do inconsciente no comportamento de um indivíduo — a uma película de estilo realista: o sonho de Swofford, ao som de Something in the Way dos Nirvana, é do melhor do tipo que se criou recentemente.

Em nota de conclusão, não poderia deixar de sublinhar o desempenho de Peter Sarsgaard,, que rouba o filme com o seu underacting, e o delicioso cameo de Dennis Haysbert, encarnando a melhor "personagem-tipo" dos últimos anos...



segunda-feira, fevereiro 13, 2006

A VIDA NÃO É UM SONHO (2000), de Darren Aronofsky



Filme notabilizado, na sua data de estreia, pela crueza da abordagem aos temas e virtuosismo técnico, A VIDA NÃO É UM SONHO destaca-se pela imensidão de referências cinematográficas que ostenta, as quais, sem desdenharem a originalidade do projecto, permitem uma apreciação à parte do ponto fulcral deste título, nem que seja por um repetido mas sempre agradável visionamento.



Em A VIDA NÃO É UM SONHO, temos amostras do cerne da Escola de Montagem Soviética, nomeadamente o artificialismo de Dziga Vertov nas repetidas transições compostas pelo consumo dos vários vícios de cada personagem; temos referências a LARANJA MECÂNICA (1971, Stanley Kubrick) nas sequências de acções mundanas em imagem acelerada; temos aspectos temáticos reminiscentes de TRAINSPOTTING (1996, Danny Boyle) no que concerne ao tratamento dos efeitos da toxicodependência no ser humano; e, por fim, podemos deliciar-nos com os jogos de pormenores dignos de Lars Von Trier, ou seja, a presença simbólica da cor vermelha em algumas sequências e a sua total dissimulação/ocultação em todas as outras cenas.

Quanto ao filme propriamente dito, não deixa de possuir a sua elegância e mérito originais. E o que mais se destaca é o modo, inteiramente inusitado, de (tão bem) representar a mente humana sob o efeito do vício. E cabe a Ellen Burstyn (no papel de Sara Goldfarb, sem dúvida merecedor de todos os prémios que arrecadou ou para os quais esteve nomeado e perdeu para a Erin Brockovich de Julia Roberts) encarnar o processo de auto-destruição que a dependência irreflectida e inexplicável provoca. A sua transformação física e psicológica, ao longo dos 90 minutos de duração do filme, é da mais assombrosa e intimidativa de que há memória em cem anos de Cinema.



Quase que se poderia dizer que estamos perante uma obra em "estado de desgraça", mas tal seria afirmado com o melhor dos significados. Darren Aronofsky (agora ocupado a finalizar The Fountain, uma das obras mais interessantes dos tempos vindouros) é responsável por conseguir filmar "decadência" de forma tão vistosa e cativante, conseguindo incluir as já citadas referências a outros títulos incontornáveis. Mesmo as sequências mais repugnantes — o que equivale ao seu arrepiante clímax — merecem a nossa atenção relativamente aos métodos impecáveis de fotografia e montagem empregues. E quando tal sucede, tudo o resto traduz-se numa experiência cinematográfica de qualidade.

P.S.: E já agora, aproveitem para dar um salto ao originalíssimo site oficial do filme...

terça-feira, fevereiro 07, 2006

ANTESTREIA DA SEMANA



É o remake mais esperado da última década. A continuação da tórrida existência de Catherine Tramell, em BASIC INSTINCT II: RISK ADDICTION.

Visto o trailer (na verdade, um promo reel não censurado), parece ser mais do mesmo. Contudo, o filme aparenta possuir um look mais frio e calculista que a sua protagonista, e o desconhecido David Morrissey [apenas uma presença de realce em HILLARY AND JACKIE (1998)] tem a figura ideal para a próxima vítima da escritora de romances policiais mais mortífera de sempre.

E adoro a frase promocional: Everything interesting begins in the mind...

domingo, fevereiro 05, 2006

UM LONGO DOMINGO DE NOIVADO (2004), de Jean-Pierre Jeunet



Jeunet consegue, mais uma vez, o prodígio de aliar virtuosismo com um argumento de qualidade — algo cada vez mais raro no panorama cinematográfico actual —, e UM LONGO DOMINGO DE NOIVADO tornou-se, para mim, num filme que merece novas visualizações e oferece a possibilidade de constantes descobertas.

Mathilde (Audrey Tautou, mais uma vez perfeita no papel da rapariga que demonstra persuasão onde menos se esperava) apaixona-se por Manech (Gaspard Ulliel), o qual tem de servir nas imundas e sangrentas trincheiras da Batalha do Somme, durante a Primeira Guerra Mundial. Acusado de auto-mutilação, juntamente com outros quatro soldados, é condenado à morte; contudo, o destino e a fraternidade do exército francês concedem-lhe a oportunidade de lutar pela sua sobrevivência, sendo deixado na terra de ninguém. Depois disso, nunca mais se soube nada dele. Quanto a Mathilde, ainda a viver os momentos idílicos que antecederam a partida de Manech, decide ir em busca do seu paradeiro, nem que para tal tenha de atravessar perigos e gastar toda a herança deixada pelos seus falecidos pais...



Ao ver UM LONGO DOMINGO DE NOIVADO, é impossível não esquecer O FABULOSO DESTINO DE AMÉLIE (2001); o realizador, equipa técnica e actriz protagonista são os mesmos, assim como é possivel detectar temas comuns entre os dois títulos (o amor, a busca da felicidade, as idiossincracias e manias que afligem o ser humano, etc.). No entanto, este filme distingue-se pelo sucesso de Jeunet em exibir tanta informação e, nem por uma única vez, causar aborrecimento no espectador. Devo confessar que, em um ou outro momento, fiquei na dúvida sobre quem era quem ou o que fizera, mas a fluidez da narrativa permite sempre o eficaz reencontro com a incessante investigação de Mathilde.

É de notar, igualmente, o interessante trabalho de fotografia, que nos transporta imediatamente para os anos 10 do século passado: uma constante impressão a sépia, presente na vida de Mathilde. O ambiente só se torna soturno (i.e., a presença dos azuis e verdes escuros) nas sequências do cenário de guerra; os significados das duas escolhas cromáticas são imediatamente compreensíveis.



Porém, volto a frisar a mestria de Jeunet na construção da história. Nenhuma ponta fica solta, e a própria conclusão do filme — inconclusiva para uns, ambígua para outros — não é mais do que o lógico corolário do que vimos antes. A mensagem do filme torna-se patente nessa sequência final e, por isso, mais perfeito não poderia ser.

sexta-feira, fevereiro 03, 2006

BLOW-UP — HISTÓRIA DE UM FOTÓGRAFO (1966), de Michelangelo Antonioni



Quantos segredos pode uma singela imagem conter e esconder?
Este pode ser o tema predominante da primeira incursão de Antonioni pelo cinema de grande orçamento, contudo, BLOW-UP é uma obra aberta a ampla e variada interpretação.

A história de Thomas (David Hemmings), fotógrafo londrino que, para além da colaboração na elaboração de um livro sobre Londres e dedicação às inevitáveis (mas entediantes, na opinião dele) sessões fotográficas de moda, vê-se a braços com um intrigante caso de homicídio, após a revelação de fotos tiradas a um casl aos beijos, durante a fortuita visita a um jardim municipal. A insistência da rapariga retratada (uma jovem Vanessa Redgrave) em obter o rolo capta a atenção do jovem artista, decidido em averiguar os porquês de semelhante "desespero". Revelando e compondo todos os contornos da cena que presenciou, Thomas detecta, ampliação sobre ampliação — justificando o blow-up do título —, a possibilidade de ter presenciado mais do que um mero encontro amoroso. Realçando os vários pormenores do ambiente circundante, ele consegue distinguir um vulto escondido entre arbustos, de arma na mão, e numa fotografia posterior, a irrefutável prova do crime... confirmada pela visão, no local, do cadáver do homem que estava com a rapariga.

O maior sucesso de crítica (Palma de Ouro em Cannes, nomeações para os Óscares de Melhor Realizador e Argumento Adaptado) e de bilheteira da carreira do realizador transalpino — facto espantoso para um filme que ostenta contornos filosóficos tão obscuros —, BLOW-UP distingue-se, maioritariamente, pelo exímio trabalho de câmara, imprevisível nos movimentos que efectua e inigualável no constante jogo de esconder/revelar pormenores que ecoam o tema da história narrada perante os nossos olhos. Um exemplo principal desta técnica é a sequência da sessão fotográfica conduzida por Thomas com as cinco modelos; dos planos de filmagem, da disposição dos adereços no estúdio e do guarda-roupa (da autoria de ) envergado pelas raparigas depende a nossa compreensão da cena e seu respectivo significado: o poder da ilusão artística contido na captação de imagens, sejam elas fixas ou em movimento.



A própria escolha estilística de realização aponta, constantemente, para uma série de simbolismos que quase obrigam o espectador à sua permanente codificação — um esforço inútil, já que nunca surge qualquer género de resolução no final do filme. Tal é evidente nas sequências das viagens de automóvel de Thomas; na forma como Antonioni filma a Londres em constante urbanização e cedência aos ritmos e vivências dos finais da década de 60; na preocupação geométrica dos planos em profundidade; nas cenas do bar onde tocam os The Yardbirds, etc. Todos estes aparentes pormenores forçam a concentração do espectador, alcançando o feito de nunca o aborrecer apesar da narrativa ser caracterizada por uma lenta fluidez.

Outro aspecto técnico de realce, indispensável para a total assimilação de BLOW-UP, é o som do filme. Desde a monótona sonoridade do vento a roçar nas folhas das árvores do jardim (no momento em que o casal é fotografado à socapa), e a sua inquietante presença no estúdio de Thomas durante a revelação das fotografias referentes àquela cena, culminando na explosão de ruído em duas sequências onde a música é protagonista (Hemmings e Redgrave a "partilharem" o ritmo de Herbie Hancock e nas cenas no clube nocturno), o baque de bolas de ténis numa cena em que não as vemos, tudo aponta para uma simbologia inerente ao filme, a qual até pode ser falsa no seu contéudo.



A derradeira sequência reforça o sentimento de estarmos perante um objecto cinematográfico que pretende, apenas, dissertar sobre a capacidade artística de iludir o próximo: após uma nova deslocação ao jardim, Thomas descobre que o cadáver já lá não se encontra e entrega-se à fantasia de um jogo de ténis disputado por mimos, para depois "desaparecer". Esta conclusão serve para constatar a intenção de Antonioni provar, acima de tudo, o mundo falacioso que rodeia o chamado "profissional liberal" — um tema abordado pelo realizador em títulos como DESERTO VERMELHO (1964) e PROFISSÃO: REPÓRTER (1975). No entanto, permanece a inexpugnável hipótese de outras interpretações, igualmente válidas e enriquecedoras para um filme imperdível.

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

AINDA A PROPÓSITO DO "OSCAR BUZZ": UM BREVE COMENTÁRIO

A lista de nomeados para os Prémios da Academia só foi divulgada ontem, contudo a "enxurrada" de erros e discrepâncias que, desde então, têm vindo a público, através dos meios de informação generalista, merece já, da minha parte, o epíteto de ridículo e ultrapassa os limites de qualquer bom senso cinéfilo.

Senão, vejamos dois casos pragmáticos, ocorridos em menos de 24 horas a seguir ao anúncio dos eleitos:
Good Night, and Good Luck não "assinala a estreia de George Clooney como realizador" (in «Jornal das 7», SIC Notícias); na verdade, o actor já desempenhou essas funções em CONFISSÕES DE UMA MENTE PERIGOSA (2002), filme que, embora não tenha ficado retido na memória de muita gente e selado por um certo cariz de "artifício" próprio de primeira obra, já possibilitou a avaliação das capacidades de Clooney;

— embora pouco habitual, Brokeback Mountain não é "o primeiro filme sobre o amor entre dois homens a ser nomeado para o Óscar de Melhor Filme (in «Bom Dia Portugal», RTP1); em 1969, O COWBOY DA MEIA-NOITE (1969), que chegou mesmo a ser galardoado com as estatuetas de Melhor Filme e Melhor Realizador, já abordava o tema, apesar da inevitável e imperativa dissimulação do mesmo causada pela época em que estreou.

Posto isto, só apetece exclamar: Mas que espécie de jornalistas são estes?! Será que formulam peças noticiosas sem proceder à devida pesquisa prévia?! Uma coisa é, por demais, evidente: a falta de cultura cinematográfica que grassa neste país mostra-se alarmante, sobretudo quando a mesma provém de instituições que pregam possuir informação "isenta, correcta e sempre de qualidade".

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