Antes de mais, uma certeza: 2012 não foi, na opinião do Keyzer Soze, um bom ano de Cinema.
O "argumentário" a favor de tal acepção poderia começar pelo facto de, dos 11 títulos que compõem o top do ano abaixo disposto, apenas dois possuem 2012 como data de produção. Mas também é inegável que, dos filmes lançados comercialmente no nosso país, assistiu-se a um ano menos conseguido por parte de alguns dos autores norte-americanos (Alexander Payne, Eastwood, Jason Reitman, Spielberg, Wes Anderson, Oliver Stone...) e internacionais (Kaurismäki, Stephen Daldry, Tykwer, Cronenberg, Ridley Scott, Nolan, Dumont, Yimou, Ferrara, Ang Lee, Carax...) mais consagrados da actualidade.
Deste modo, o melhor de 2012 acabou por surgir da mistura entre o alternativo e o apelo público, entre a postura cinematográfica clássica e a irreverência de autores plenos ou em formação do seu estilo, entre a observação do passado da Sétima Arte e a busca pela sua subversão/aproximação ao futuro que não aliena o espectador.
Para debate, refutação e memória futura, segue a habitual selecção do Keyzer Soze dos melhores filmes de 2012:
10º ex-aequo
UMA LISTA A ABATER (Ben Wheatley)
«Sem moralidades políticas nem pendões estéticos claramente reconhecíveis, Ben Wheatley concebe uma obra que tanto pode ser o perfeito midnight movie para Halloweens vindouros como (perigoso?) objecto de análise junto das falanges de apoio ao Movimento Occupy Wall Street.»
É NA TERRA NÃO É NA LUA (Gonçalo Tocha)
«Narrado a duas vozes, inefáveis em partilhar os momentos mais curiosos da sua rodagem, é uma obra singular e de constante descoberta, sem precipitar a revelação das vidas e costumes dos 450 habitantes do Corvo, tão obscuros e distantes quanto a sua localização geográfica.»
9º
O MOINHO E A CRUZ (Lech Majewski)
«Eleva a expressão "quadro vivo" a um hipnotizante nível, e comprova, da forma mais bem sucedida a que pude assistir nos últimos tempos, as magníficas potencialidades do digital em função das intenções de um filme.»
8º
VERGONHA (Steve McQueen)
«Confirma o seu estatuto de proeza cinematográfica do ano transacto não só pelo retrato humanamente sombrio, de um hedonismo camuflado de sex addiction e da alienação social do seu protagonista, como também pela "geometria" dos corpos, rostos e espaços (num registo frio e absolutamente anti-erótico) de Steve McQueen, que não concede, nem por um minuto, conforto ao espectador.»
7º
MARTHA MARCY MAY MARLENE (Sean Durkin)
«Reflexão inteligente, ameaçadora e extremamente pungente sobre as formas como certos cultos alimentam-se de vulnerabilidades psicológicas para inculcar convicções que tanto podem apelar ao nirvana budista como, logo de seguida, degradam a mente e o corpo dos seus seguidores.»
6º
ERA UMA VEZ NA ANATÓLIA (Nuri Bilge Ceylan)
«A câmara de Bilge Ceylan captura a natureza, simultaneamente irreal e mundana, em que o filme se contextualiza e na subtil "explicação" das personagens de ANATOLIA — que, na sua conclusão, substitui o cariz mítico da morte pelas suas consequências físicas e sociais, deixando-nos com a tarefa de definir onde reside a "eternidade" destes indivíduos.»
5º
A INVENÇÃO DE HUGO (Martin Scorsese)
«Eis o tipo de filme que, entre outras sensações, leva-me a abandonar a generalização crítica usual e confessar a minha predilecção por temas como o da preservação e restauro do Cinema clássico. São, para mim, como um perfume delicado ou idêntico ao sentimento que se nutre pela pessoa amada: totalmente irresistíveis.»
4º
AMOR (Michael Haneke)
«Por vezes incomportável, nunca irónico mas pleno de amor do princípio ao fim — porque é uma certeza, o amor, o verdadeiro, dependente e irrestrito amor está espelhado ao longo dos seus 127 minutos de duração. »
3º
TABU (Miguel Gomes)
«Pelos sons e imagens com que Miguel Gomes nos brinda, de forma poética, impressionista e quase etérea, é, narrativamente, um melodrama por excelência e, nas intenções, homenagem singela e original ao género de cinema que nos obriga a considerar os olhares, gestos, trejeitos faciais e enquadramento de cenas sem que uma única palavra seja escutada para daí extrairmos o seu predicado.»
2º
TEMOS DE FALAR SOBRE KEVIN (Lynne Ramsay)
«Obra-prima na desconstrução da linearidade temporal do argumento — a capacidade do espectador apreender a cronologia de vários flashbacks é testada ao limite — e na oscilação, sempre periclitante e arriscada, entre o realismo puro e a fuga para a ilusão.»
1º
PROCUREM ABRIGO (Jeff Nichols)
«Mais do que o retrato da provável degeneração mental de um indivíduo, coloca o protagonista como epíteto da Humanidade contemporânea: amedrontada, paranóica e confusa face às agressivas "manifestações" que a rodeia — e, no horizonte, tudo prenuncia a chegada de inimagináveis tempestades.»
Menções honrosas para (e por ordem de estreia no nosso país):
a viagem no tempo de A GRUTA DOS SONHOS PERDIDOS (Werner Herzog); o estado de uma nação em ATTENBERG (Athina Rachel Tsangari); os jovens com super-poderes de CRÓNICA (Josh Trank); o poder — real ou fabricado — da imagem documental de LINHA VERMELHA (José Filipe Costa); o road movie em direcção ao passado de ESTE É O MEU LUGAR (Paolo Sorrentino); a reinvenção visual de um clássico em MONTE DOS VENDAVAIS (Andrea Arnold); a simplicidade da abordagem autoral aos filmes de acção de HAYWIRE — UMA TRAIÇÃO FATAL (Steven Soderbergh); o fim do mundo em O CAVALO DE TURIM (Béla Tarr e Ágnes Hranitzky); o sagrado e o pagão em CORPO CELESTE (Alice Rohrwacher); a saída para a crise financeira de ELENA (Andrei Zvyagintsev); Jack Black em MORRE... E DEIXA-ME EM PAZ! (Richard Linklater); a "metaficção" do terror em A CASA NA FLORESTA (Drew Goddard); e 007 — OPERAÇÃO SKYFALL (Sam Mendes), o blockbuster do ano.