sábado, outubro 22, 2005

A NOITE DA VINGANÇA (1994), de Roman Polanski



Sempre que ouvimos falar de um filme que sustenta uma mensagem de moralidade política e ética democrática, pensamos imediatamente numa história repleta de cenas de tribunais, advogados indecisos, vítimas sequiosas de justiça e suspeitos que escondem, até à última cena, a sua inocência ou culpa. A NOITE DA VINGANÇA revela-nos tudo isto, mas de uma forma completamente original.

Situamo-nos num país da América do Sul em convalescência após décadas de um governo ditatorial, cuja recente democracia pretende perseguir, capturar e julgar todos os envolvidos num sistemático processo de tortura dos membros de vários movimentos resistentes da altura. Entre as vítimas desses métodos, encontramos Paulina Escobar (Sigourney Weaver), cujas dolorosas recordações da sua encarceração ainda se assemelham a feridas que teimam em cicatrizar. Casada com um magistrado em ascenção (Stuart Wilson), a sua vida tem sido oprimida por estas memórias e pela tentativa de prosseguir uma existência dentro da normalidade. Até ao dia em que, durante uma noite de tempestade, o seu marido apanha a boleia de um médico, o dr. Roberto Miranda (Ben Kingsley), cuja voz e maneirismos levam Paulina a crer que se trata do homem que, no passado, a torturou mais assiduamente...



O que assistimos a seguir é o que se pode apelidar de "julgamento público", tornando o espectador em jurados, num banco dos réus dissimulado de casa isolada numa península onde a luz e o telefone ficam cortados sempre que o clima se torna mais instável. Este é o feito mais extraordinário da realização de Polanski: apesar do reduzido espaço a que a história está confinada e de haver apenas três personagens durante o filme inteiro, nunca experienciamos qualquer tipo de claustrofobia ou tédio. Para além disso, somos obrigados a reviver um passado penoso sem o recurso de flashbacks, todo o sofrimento e humilhação a que Paulina foi sujeita é-nos transmitido pelos diálogos e composição de Weaver.

Para tal, há que realçar o magnífico trabalho de câmara de Tonino Delli Colli (responsável por obras como O BOM, O MAU E O VILÃO e ERA UMA VEZ NA AMÉRICA), o qual explora todos os cantos desta casa de campo onde se procura desvendar o mistério envolvido na personagem de Kingsley. No entanto, o triunfo está do lado dos actores: Weaver é capaz, na mesma sequência, de demonstrar terror e feroz determinação; Kingsley compõe um carácter inofensivo mas ambíguo; e Wilson encarna, de forma brilhante, o papel do céptico mais reactivo de que há memória.



Apesar de, no seu tema, se tratar de um filme diferente na filmografia de Roman Polanski, encontra-se aqui todos os elementos que caracterizam o seu legado cinematográfico: a paixão fora de todas as convenções, a súbita perturbação da calma interior dos seus personagens e a disciplinada forma de filmar os momentâneos e improvisados desejos de um indivíduo.

5 comentários:

Anónimo disse...

O meu caso é o mesmo do Lisbon...está na minha lista a ver :P!

brain-mixer disse...

Ohh, prefiro a Sigourney Weaver dos tempos da saga Alien :D

Miguel Andrade disse...

A Morte e Donzela (No brasil)foi uma grata surpresa. Pelo pouco barulho, esperava menos... Mas enfim, pequeno e concreto.

Francisco Mendes disse...

De Polanski, continuo a preferir o claustrofóbico e mórbido “Repulsion” (1965), o paranóico “Rosemary’s Baby” (1968) e a sua Obra-Prima, o maravilhoso “Chinatown” (1974).
Cumprimentos.

Miguel Andrade disse...

Pegando carona no coment do Francisco, meu Polanki favorito é O Inquilino... Genial! Genial!!!

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