domingo, setembro 23, 2007

Oldboy (2004), de Park Chan-wook



Há uma cena em OLDBOY que ilustra, de forma pragmática, tudo o que o filme expressa: num longo plano-sequência, assistimos ao protagonista (Oh Dae-su) a desancar, com o auxílio de um martelo e das próprias mãos, um grupo de irados guardas prisionais, ao longo de um corredor imundo e mal iluminado — no fim, Dae-su sai triunfante, não obstante ter um punhal enterrado nas costas e dos "litros" de sangue derramados durante a luta.

A composição formal desta sequência é, ao mesmo tempo, violenta, surreal, cómica e imprevisível. Sugere, por vezes, a aliança de um videogame com o que de melhor é permitido pelo cinema digital. OLDBOY é tudo isto, acreditem. No entanto, resumi-lo como uma peça de mero virtuosismo cinematográfico seria injusto; amiúde, OLDBOY atinge estatuto de poderosa narrativa.



Em cenário reminescente às obras de Franz Kafka, Oh Dae-su (interpretado por Choi Min-sik) permanece encarcerado, num berrante quarto de hotel, durante 15 anos, sem saber os motivos ou os responsáveis pela sua detenção. Entretanto, descobre pela televisão que a sua esposa foi assassinada e a filha entregue a pais adoptivos. Quando finalmente é libertado, a ânsia de vingança sobrepõe-se a qualquer outra ambição.

É então que o caminho de Oh Dae-su se cruza com o de Mido (Kang Hye-jeong), uma simpática cozinheira de um restaurante de sushi. Demonstrando a princípio compaixão por ele, Mido ajuda Dae-su no seu processo de recolha das pistas necessárias para encontrar o autor daquela estranha prisão.



A resposta para todas as dúvidas parece residir em Woo-jin, astuto homem de negócios e residente da penthouse mais state-of-the-art alguma vez observada — no fim, descobrimos que Woo-jin não só foi o responsável pela captura de Dae-su, como também foi o manipulador supremo dos restantes protagonistas, num clímax de contornos devastadores.

As revelações que concluem OLDBOY não escondem o aspecto mais trabalhado pelo realizador Park Chan-wook, ou seja, o já referido espalhafato visual. Durante 120 minutos, somos brindados com todo o género de situações capazes de perturbar o mais empedernido dos espectadores: personagens a devorarem polvos vivos, mãos decepadas, dentes arrancados e até um intricado subplot sobre incesto. A contribuir, temos uma parafernália de técnicas (grandes angulares, planos expressionistas, slow e fast motions, etc.) que definem OLDBOY como um dos filmes mais criativos de 2004.



O idílico final não afasta qualquer sentimento de agitação que possamos sentir. Na verdade, a conclusão de OLDBOY lança mais questões do que respostas — estimulando, inclusive, uma discussão acesa entre os seguidores do filme, os quais tornaram-no num dos mais recentes filmes de culto. Premiado internacionalmente (obteve, das mãos de Quentin Tarantino, o Grande Prémio do Júri em Cannes), OLDBOY é, em última instância, uma obra-prima meticulosamente orquestrada e merecedora de destaque aquando duma futura retrospectiva da Sétima Arte da presente década.

Enquanto que a realização, a direcção da fotografia e o argumento são os seus músculos, a personagem de Oh Dae-su é o verdadeiro motor do filme — um estudo bem sucedido sobre vingança ou uma análise arrojada dos conflitos interiores que grassam na Humanidade? De qualquer maneira, OLDBOY consegue o que outros são incapazes de fazer: entreter-nos à custa de uma sentida dor emocional. Nem que para tal tenhamos de "penetrar" em sequências tão intensas e distractivas como a que referi no início deste texto, capazes de granjearem, por elas próprias, uma crítica exclusiva.

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