segunda-feira, abril 19, 2010

A CAIXA (2009), de Richard Kelly



Richard Kelly, argumentista e realizador do muito amado DONNIE DARKO (2001) e do muito detestado SOUTHLAND TALES (2006), tem uma predilecção pelo apocalíptico. Tal como nesses filmes, este A CAIXA é sincero, sinistro e inevitavelmente ambicioso, uma obra séria que insiste sempre na sua seriedade mesmo quando arrisca precipitar-se no absurdo. E à semelhança desses anteriores títulos, Kelly recorre a um particular género (nesta caso, o terror/suspense) para dissertar acerca da condição humana (ou condicionamento), entre um emaranhado de alusões culturais e cenários de catástrofe eminente. Para o cineasta, o "fim" nunca está próximo. O "fim" é uma realidade presente.

As semelhanças entre estes três filmes são marcantes e sugerem que ou Kelly está empenhado no desenvolvimento de uma visão labiríntica do mundo enquanto veículo para a abordagem de pertinentes questões filosóficas ou, em contrapartida, preso a um contra-relógio de impasse criativo.



"Navegando" nesta incerteza estão, também, os protagonistas de A CAIXA. Norma e Arthur Lewis (Cameron Diaz e James Marsden), são um casal da classe média, aparentemente feliz e próspero, residente num agradável subúrbio da Virginia, nos anos 70, com o seu filho Walter (Sam Oz Stone). No entanto, Norma, professora num liceu particular, e Arthur, engenheiro da NASA que aspira ser promovido a astronauta, vivem acima das suas possibilidades económicas e morais. Apesar do carro desportivo de última gama estacionado na garagem, Norma depara-se com o inesperado cancelamento da bolsa de estudos do filho e Arthur é surpreendido pela notícia de que a sua promoção foi rejeitada. Não admira, portanto, que ambos ponderem, com imenso interesse, a oferta de um milhão de dólares que lhes bate, literalmente, à porta.

Mas esta recompensa surge com uma áspera condição: assim que for pressionado o botão vermelho numa pequena caixa de madeira, alguém no mundo e completamente desconhecido para os Lewis tem de morrer, tal como lhes é assegurado pelo portador da oferta, Arlington Steward (Frank Langella), um homem de modos refinados e cara terrivelmente desfigurada. Com apenas 24 horas para chegarem a uma decisão final, o passo fulcral é dado por Norma. Ou seja, o botão é pressionado...



Revelar mais pormenores do argumento constituirá uma ameaça ao desfruto de A CAIXA por parte de quem ainda não o visualizou. Porque o filme, apesar da potencial absurdidade da sua narrativa, é surpreendentemente fluído e inspirado, sem um único momento morto de grande registo e capaz de prender o espectador até aos últimos frames. Os predominantes castanhos da fotografia recordam-nos películas dos anos 70, a banda sonora é arrepiante, a montagem descortina circunstâncias e locais de uma forma que invejaria o próprio Stanley Kubrick quando este filmou SHINING (1980). E as interpretações não saem envergonhadas, com o "renascido" Frank Langella apropriadamente intimidador na figura de um peculiar anjo da morte e Cameron Diaz a dar razão aos que acreditam que a actriz deveria explorar, mais e melhor, o seu lado "negro".

A principal conclusão de A CAIXA (porque da sua história é bem possível que não se tire muitas, depende imenso dos gostos de cada um) é a de que Richard Kelly assume-se como um cineasta detentor de visão incomparável no actual panorama norte-americano, mas que precisa, urgentemente, de encontrar um argumentista parceiro capaz de limar e esclarecer as suas ideias. Com tantos apontamentos visuais de qualidade, é pena que o realizador os extravie num manto de assuntos dispersos, aprisionando o seu talento numa "caixa" por ele mesmo concebida.

11 comentários:

Unknown disse...

Tinha lido tantas críticas negativas acerca deste filme que acabei por ignora-lo mas agora deste-me vontade de o visualizar.

Apenas não concordo quando referes o "renascido Langella". Se houve local onde renasceu foi em Frost/Nixon que quanto a mim foi a melhor interpretação do seu ano.

Abraço

Sam disse...

Caro Filipe,

eu nunca faço críticas negativas, procuro sempre destacar o positivo de cada filme — porque Cinema Is My Life! ;)

E quando digo "renascido", refiro-me à carreira recente de Langella, incluindo, obviamente, FROST/NIXON (e partilho a tua opinião de que foi a melhor interpretação daquele ano).

Abraço.

AlexSupertramp disse...

Não gostei do filme, no geral. E achei a interpretação de Cameron Diaz uma das piores, senão a pior de toda a sua carreira.

Abraço

Sam disse...

Alex, obrigado pela tua opinião.

Cameron Diaz não é das minhas actrizes favoritas — aliás, tenho sérias dúvidas acerca do seu "talento" —, mas apreciei esta sua caracterização pouco 'glamourizada'.

Volta sempre. Abraço.

Bruno Cunha disse...

Pelo que dizem, devo apenas me conter com o perfeito Donnie Darko de Richard Kelly...

Abraço
Cinema as my World

Ricardo Vieira disse...

Eh pá não gostei deste filme. Após o Donnie Darko, devo dizer que Kelly desiludiu-me imenso. Contudo existem cenas interessantes e muito esquisitas. Tem algum ambiente, mas acho que se perdeu.

brain-mixer disse...

Delirei com Donnie Darko (foi também por ele que as temáticas brain-mixer acabaram por criar o blog), e confesso que gostei de Southland Tales. Mas est The Box ficou muito aquém do que esperava. Infelizmente.

E o Alex tem toda a razão: A Cameron Diaz está péssima no filme.
Abraço, Sam!

Tiago Ramos disse...

Eu até gostei do filme. Muito curioso, bem filmado - a mim remete-me mais para filmes de série-B dos anos 50 - e curiosamente nem achei a Cameron Diaz assim tão má. E a forma como mistura ficção-científica está bastante interessante.

ArmPauloFerreira disse...

Muito bom o texto, com boa argumentação e cuja critica ao filme é bastante realista. basta se ter tolerãncia que se descobre aqui um grande filme...
Well done!

Sam disse...

Armindo,

como amante da Sétima Arte, procuro ser sempre tolerante com qualquer filme. Nunca é de ânimo leve que "deito abaixo" um título.

Neste caso, formulei a opinião aqui escrita imediatamente e a mesma ainda não se desvaneceu.

Obrigado pelo teu comentário!
Abraço.

ArmPauloFerreira disse...

Em tempos cheguei a reunir algumas criticas sobre o filme "The Box".
Há muita gente, incluindo eu, que soube apreciar o filme e gostou:
The Box: o que dizem por ai do filme de Richard Kelly...

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