domingo, janeiro 23, 2011

Críticas da Semana

Breve resumo dos filmes visualizados esta semana.

THE NOTORIOUS BETTIE PAGE (2005), de Mary Harron



Nos primeiros anos da década de 50, Bettie Page, ambiciosa e ingénua, escapa à existência conservadora de Nashville para ser actriz em Nova Iorque. Um fotógrafo amador descobre-a numa praia de Coney Island. Pouco tempo depois, começa a ser solicitada para catálogos de moda, revistas masculinas e publicações ilustradas de sado-masoquismo. Pela sua beleza, a História conhece-a como a «Rainha das Pinups»; pelo escândalo que protagonizou, ficou associada a um dos maiores inquéritos, promovidos pelo Senado, sobre indecência pública.

Sem pretensões de argumentar acerca da liberdade de expressão (tema que costuma dominar este género de filme) nem fazer a inusitada observação de uma época, THE NOTORIOUS BETTIE PAGE é um biopic tão espirituoso e descomplexado quanto a pessoa que retrata. Gretchen Mol, num misto de puritanismo e sensualidade, "carrega" o filme inteiro e deixa antever mais talento do que decisivas oportunidades de carreira.

O SEGREDO DOS SEUS OLHOS (2009), de Juan José Campanella



Benjamin Espósito, um agente federal reformado, tenta completar um romance na esperança de se reconciliar com o seu passado. Nomeadamente, um caso de violação e homicídio de uma jovem mulher que nunca ficou bem resolvido e o amor não correspondido que sentia pela sua superior. Vinte e cinco anos depois, Espósito não consegue encerrar estes dois capítulos da sua vida, ao mesmo tempo que novos pormenores sobre a investigação criminal conhece a luz do dia.

Vencedor surpresa do Óscar para Melhor Filme Estrangeiro no ano passado, faz justiça ao prémio com uma história imprevisível, argumento cativante e rico em simbolismo, excelentes interpretações (sobretudo o protagonista Ricardo Darín, actor oriundo da televisão, que demonstra um registo de impecável profundidade) e a realização firme de Campanella, capaz até de reinventar as "normas" do plano sequência. O cinema sul-americano atravessa um frutífero período de vitalidade e O SEGREDO DOS SEUS OLHOS é prova cabal disso mesmo.

A SERBIAN FILM (2010), de Srdjan Spasojevic



Milos, um dos principais nomes da indústria pornográfica sérvia, retirou-se do meio e procura construir um novo percurso de vida, nomeadamente sustentar mulher e filho num país a recuperar de anos de guerra. Pelas dificuldades que toldam esse objectivo, é aliciado a participar num art film. Mas durante a "rodagem", Milos compreende que foi arrastado para algo mais sinistro do que o mero porn movie.

Filme-choque de vários festivais europeus (suscitando, inclusive, processos crime), a sua abundante e pragmática violência — alguns salientariam o sexo mas, neste contexto, seria redundante —, defende uma suposta mensagem política sobre o passado recente da Sérvia que ninguém (excepto o cineasta?) apreende. Realização pedestre, argumento incoerente, nenhuma interpretação memorável. Salva-se a sua vontade de quebrar tabus e lançar o debate sobre o que é "aceitável" em Cinema. Só por isso, não leva o rótulo de medíocre.

EXIT THROUGH THE GIFT SHOP (2010), de Banksy



Esta é a história da ascensão meteórica de Thierry Guetta, um excêntrico imigrante francês que de cineasta amador e quase inepto, transformou-se em nome de referência da arte pop inspirada na street art, forma artística caracterizada na decoração de cidades com graffitis e stencils de mensagem política. Pelo meio, acompanhamos o coração da arte urbana, a influência que o célebre e polémico Banksy exerceu em Thierry e reflectimos sobre o estado actual do que significa arte.

O «primeiro filme desastre sobre arte urbana» revela-se um poderoso documentário que escrutina a transformação da criatividade em objecto com código de barras, assim como a atitude dos que gastam fortunas para a adquirir. Banksy, enquanto realizador, é tão corrosivo quanto uma serigrafia sua. A veracidade deste documentário (as opiniões dividem-se) mostra-se de pouca importância, atentemos à sua mensagem. Entretenimento colorido e de grande calibre.

DELIVER US FROM EVIL (2006), de Amy Berg



Oliver O'Grady, padre católico condenado pelo abuso sexual de menores que cometeu em quatro paróquias da Califórnia nas décadas de 70 e 80, arrepende-se desses crimes e utiliza o documentário como forma de se retractar perante as vítimas. O conflito é proporcionado pelos testemunhos de famílias que, ainda hoje, estão destroçadas e pela análise de como a Igreja, enquanto instituição, lidou ao longo dos anos com o caso de O'Grady.

O meu interesse por este documentário adveio da notícia da reincidência de O'Grady, o seu "protagonista". Embora seja um pormenor, este desenvolvimento posiciona DELIVER US FROM EVIL como um filme datado, paladino de argumentos que expiraram pelas circunstâncias e cuja visualização servirá apenas como aviso de um problema com contornos ainda pouco esclarecidos. A sua composição formal, contrastando a figura de um homem visivelmente doente (fala dos seus crimes como se de "travessuras" se tratassem) e genuínos depoimentos de dor e revolta, sai fragilizada pelo desejo de abordar demasiados pontos de vista numa metragem reduzida e, no fim, não consegue expressar quaisquer conclusões.

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