domingo, janeiro 29, 2012

Críticas da Semana

Breve resumo dos principais filmes visualizados esta semana:

. ZEITGEIST: MOVING FORWARD
. O ARTISTA
. MILLENNIUM 1 — OS HOMENS QUE ODEIAM AS MULHERES

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. ZEITGEIST: MOVING FORWARD (2011), de Peter Joseph



Criando um modelo de compreensão do actual paradigma social e do motivo pelo qual é fundamental sair do mesmo — juntamente com uma nova abordagem social, que apesar de radical, é ainda assim, prática —, procura-se encontrar uma resolução dos actuais problemas sociais que afligem o mundo.



Se tiverem duas horas e quarenta minutos da vossa vida para dispensar a este documentário, serão capazes de entender que esse tempo não só passará num ápice, como também proporcionará uma experiência elucidativa acerca das causas que forjaram o espectro da crise financeira mundial que todos os dias nos entra pela casa, culminando numa enumeração de "soluções" mais utópicas do que propriamente reformadoras.

Sem a visceralidade de Michael Moore nem a ironia de Errol Morris, ZEITGEIST: MOVING FORWARD aposta numa irreverência quase juvenil para atacar os "vícios" do sistema, recorrendo a diferentes estilos de animação para esquematizar a informação e valores transmitidos e — na que será a principal novidade deste género de documentário — uma abordagem a vicissitudes biológicas e antropológicas explicativas do actual estado da Humanidade. Não estamos perante algo que ficará rotulado como revolucionário, mas a sua qualidade de eye-opening converte-o em algo de visualização urgente.

. O ARTISTA (2011), de Michel Hazanavicius



Hollywood, 1927. George Valentin (Jean Dujardin) é uma das maiores estrelas do cinema mudo. Certo dia, conhece Peppy Miller (Bérénice Bejo), uma jovem e ambiciosa figurante, por quem fica fascinado. Mas a chegada dos filmes sonoros marca o fim da carreira de George, e torna Peppy na nova grande estrela da indústria.



Como é possível gostar-se de um pastiche? Até que ponto pode o artificialismo do Cinema se tornar no seu principal inimigo? E qual o propósito da integração do «Love Theme» de A MULHER QUE VIVEU DUAS VEZES (obra sonora e a cores) no acompanhamento musical de um filme mudo e a preto e branco? Estas e outras questões ressalvam a constatação de que O ARTISTA é uma homenagem intrincada ao cinema mudo americano, que almeja ignorar tudo o que de fascinante e memorável existia naquela era, focando-se numa miscelânea de cultura geral cinematográfica e melodrama previsível convenientemente reunidos para o converter num produto de imediato apelo popular e (como se verificou, esta semana, pelo anúncio das suas dez nomeações) muito oscarizável.

Ironia das ironias, e não obstante a sua "tríade" de inegáveis qualidades — a interpretação e charme de Jean Dujardin, que emula o poder de sedução de Rudolph Valentino com o percurso biográfico de John Gilbert; a competente realização de Hazanavicius; e o expressivo companheiro canino do protagonista —, faz-nos constatar que o encanto inerente ao filme mudo residia, precisamente, naquele seu "défice tecnológico". E não há apostas vanguardistas baseadas em métodos obsoletos capazes de anular o sentimento de embuste que se detecta no cerne de O ARTISTA. Para verificar homenagens contemporâneas, e mais bem conseguidas, ao Cinema dos anos 20, continuo a preferir Guy Maddin. O qual também assina, de vez em quando, uma ou outra comédia musical...

. MILLENNIUM 1 — OS HOMENS QUE ODEIAM AS MULHERES (2011), de David Fincher



Mikael Blomkvist (Daniel Craig), jornalista recentemente caído em desgraça mediática, aceita o trabalho de desvendar o desaparecimento da sobrinha de Henrik Vanger (Christopher Plummer), o patriarca de uma poderosa família empresarial sueca. Com a ajuda de Lisbeth Salander (Rooney Mara), hacker de alto nível com problemas de comportamento social, irão desvendar muitos segredos da família de Henrik, até então escondidos na penumbra.



A minha admitida desconfiança relativamente a remakes não é segredo para quem acompanha este espaço com regularidade. E enquanto admirador da primeira transposição ao Cinema dos livros de Stieg Larsson, a exigência em torno desta abordagem norte-americana à história era redobrada... e não saiu defraudada. Retomando temas e ambiências que preenchem a sua filmografia (crime e castigo, o sereno e o furioso, a amizade e a hostilidade) e demarcando-o de qualquer comparação com o filme sueco através da sua reconhecível mise-en-scène, Fincher forja um produto inteiramente seu e, a espaços, mais próximo que a referida primeira adaptação das intenções da fonte literária — a qual é excelente, logo não havia como falhar.

Posto isto, é necessário e inevitável reservar a nossa atenção para a encarnação de Rooney Mara em Lisbeth Salander, uma das mais complexas personagens de ficção femininas do nosso tempo. Numa visível entrega de corpo e alma pela jovem actriz ao desafio colocado, faz-nos esquecer a (quase icónica) prestação de Noomi Rapace, através de certeiras nuances do argumento que potenciam a androginia psicológica e antecipam, na sua caracterização, o passado conturbado de Lisbeth. O mundo ganha dois óptimos "descendentes cinematográficos" de uma saga literária de sucesso mas, tal como sucedia na adaptação europeia, ainda não foi desta que se transpôs para o grande ecrã as ansiedades sócio-políticas que selaram os últimos dias de Stieg Larsson — a primazia continua a ser dada ao thriller, mas um pouco mais de ambição não seria, por estes lados, mal recebida.

7 comentários:

O Narrador Subjectivo disse...

Ainda não vi O Artista, mas realmente não sei qual é o espanto, quando Guy Maddin faz filmes cómicos mudos há anos.

http://onarradorsubjectivo.blogspot.com/

A Bola Indígena disse...

Fiquei surpreendido com a nota ao The Artist, mesmo não tendo ainda visto o filme. Foram as expectativas demasiado altas se calhar :\

Inês Moreira Santos disse...

Fiquei com alguma curiosidade relativamente ao documentário, mas, neste caso, vou focar-me principalmente nos outros dois filmes a que já tive oportunidade de assistir.

Como já to disse, O Artista acabou, também para mim, por se relevar um pouco menos surpreendente do que esperava. Achei o argumento já muito gasto, e podia ter-se arriscado muito mais nesse campo.
Apesar de tudo, surpreendeste-me com a nota(btw, Adorei teres feito a referência ao cão).


Por outro lado, fico satisfeita por ver que um tão grande fã dos livros Millennium e, pelo menos, do primeiro filme sueco, ficou agradado com o remake do Fincher. O filme, como sabes, agradou-me bastante também.

Loot disse...

Concordo com a tua opinião do Millenium. O que se sente mais falta no filme do Fincher é um pouco do espírito Sueco, aquele sentimento activista na personagen de Mikael e relegada para segundo plano.

No que toca a thriller é muito funcional, é uma área que o realizador também domina.

Estranhei o sotaque sueco nos actores. A ideia é ser o filme mais sueco possível feito por americanos e falado em inglês? :P

E viva o product placement também lol.

Abraço

Sam disse...

O Narrador: quando ouvi falar nos contornos do filme, cheguei a julgar que fosse algo na linha de Maddin; infelizmente, desiludiu-me...

André Sousa: não vejas o filme com esta nota em mente, trata-se apenas da minha opinião :)

Inês: sim, este remake/nova adaptação do livro é muito fiel ao espírito que me tornou fã de Stieg Larsson — e sim, é impossível não gostar do cãozinho de O Artista! :)

Loot: existe, na saga Millennium, uma enorme carga de denúncia política — sobretudo, no que toca à influência de ideais neo-nazis na Europa contemporânea — que os filmes nunca conseguiram traduzir, e acho que a questão do sotaque foi para tornar o filme o mais "sueco" possível :)

Obrigado a todos pelos comentários!

Loot disse...

Eu não li o livro mas do que me recordo acho que no filme sueco se nota mais a influência neo-nazi e toda a carga política do que nesta versão.

Certamente que no livro ainda mais, até pelo formato

César Paulo Salema disse...

pois eu gostei muito do ARTISTA. Achei uma pérola de cinema, de subtileza e amor a si próprio... Há muito tempo que não me via tão colado ao écran, deixando passar as imagens, ouvindo a música-actriz e vendo as emoções na ponta dos sorrisos e no arquejar de sobrancelhas...

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