Breve resumo dos principais filmes visualizados esta semana:
. FINIS TERRAE
. ARAYA
. SOY CUBA
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. FINIS TERRAE (1929), de Jean Epstein
Na costa bretã de Bannec, dois jovens marinheiros dependem da recolha de algas para sobreviverem, as quais serão vendidas a fábricas de produtos químicos. Mas mesmo nesta rotina pacífica, há conflitos que podem alterar a vida de uma comunidade inteira.
Obrigatório e primordial exemplo de cinema etnográfico mesmo antes do género ter sido cunhado, Epstein distancia-se do documentário histórico sobre um local e actividade comercial agora extintas através da poesia que imprime nas suas imagens de cariz naturalista. Contrastando com a aridez da paisagem marítima de Bannec, encaramos o seu simbolismo visual — sobretudo na brilhante sequência inicial, a destacar uma garrafa de vinho estilhaçada ou uma roda de madeira que há muito não é usada — como correlação directa à pobreza e humildade das vidas aqui representadas.
Para as audiências modernas, FINIS TERRAE revelar-se-à como objecto cinematográfico surpreendentemente dinâmico, atestando a mestria técnica de Jean Epstein e, tendo em conta o debate recente suscitado por O ARTISTA, o poder visual e expressivo do cinema anterior ao aparecimento do filme sonoro. A câmara enfatiza a dureza das expressões e comportamentos das personagens — todas interpretadas por actores não-profissionais e oriundos daquela localidade —, numa espécie de neo-realismo que antecipa, em décadas, o trabalho de Rossellini e que, num argumento "escrito" por imagens, liberta o espectador para qualquer interpretação moral da história. Obrigatório.
. ARAYA (1959), de Margot Benacerraf
Documentário "ficcional", lírico e realista sobre a remota península de Araya, no norte da Venezuela, uma das regiões mais estéreis do mundo, onde a sobrevivência dos seus habitantes provém, apenas, do que o mar produz: sal e peixe.
Premiado em Cannes no seu ano de estreia, eis o assombroso registo de uma cultura e geografia singulares onde "tudo era desolação", refere o narrador no monólogo de introdução. E essa desolação surge, simultaneamente, bela e aterradora, como poucos alguma vez almejaram: o implacável sol — perfeitamente registado pelo director de fotografia Giuseppe Nisoli — que se abate sobre a região de Araya é capaz de deixar, literalmente, qualquer espectador sequioso; o isolamento do seu povo palpável; por vezes conseguimos mesmo "sentir" as feridas que o trabalho nas salinas causa à pele humana.
O microcosmos de rotina e ambições humanas mínimas, apresentado em ARAYA, constituirá objecto de estudo privilegiado para sociólogos — as comparações possíveis entre o contexto aqui filmado e as angústias do mundo industrializado são intermináveis —, mas Benacerraf parece mais interessada em mostrar o lado humano de um local único, quase nos antípodas do nosso. Mas onde também se ama, trabalha, sofre e (sobre)vive. De visualização recomendada, ainda para mais com a recente restauração que lhe foi devotada pela Milestone Films.
. SOY CUBA (1964), de Mikhail Kalatozov
Através de quatro narrativas, descreve-se a lenta evolução de Cuba desde o regime de Batista à revolução de Fidel Castro.
Fruto de um investimento propagandista soviético de proporções inusitadas para a sua época, com o intuito de "elevar os méritos da Revolução Cubana sobre os vícios da cultura norte-americana", é indubitavelmente mais interessante enquanto feito de perícia técnica do que eficaz na explanação de conteúdos políticos. SOY CUBA será, sempre, o documentário com dois dos planos-sequência mais fabulosos da história do Cinema: o ambiente de festa num hotel de Havana desde o seu terraço até à piscina e o funeral de um jovem revolucionário são peças de Cinema quase "impossível".
A estética ressoa no espectador, a composição narrativa nem tanto. SOY CUBA é um filme datado pela sua relação íntima a uma época e regime político específicos, pouco subtil nos dogmas que patrocina (os "maus" são imediatamente reconhecidos pelo aspecto físico) e o seu espírito político poderá já nem reflectir o de Cuba dos nossos dias. Todavia, o brilhantismo visual de Kalatozov continuará a maravilhar espectadores e influenciar todas as gerações de cineastas.
domingo, fevereiro 12, 2012
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4 comentários:
Belos textos, como sempre, Sam.
Fiquei bastante curiosa para ver principalmente o Finis Terrae.
Cumprimentos cinéfilos,
Inês
Obrigado Inês, e ainda bem que o texto suscitou-te curiosidade :)
Para mim, são obras semi-esquecidas que mereciam mais visionamento.
Cumps cinéfilos.
Por acaso vi este fim de semana um documentário de que gostei muito do Mikhail Kalatozov, "Sol Svanetii" (1930).
Paulo, já o tenho agendado para ver em breve; obrigado pela recomendação :)
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