A exibição cinematográfica na ilha de São Miguel conheceu os seus primeiros passos, na primeira década do Séc. XX, através do pioneirismo da já extinta Empresa "Santos & Companhia", que em 1908 promoveu sessões constituídas pelas imagens em movimento dos funerais do Rei D. Carlos e do príncipe herdeiro D. Luís Filipe e vistas panorâmicas de cidades europeias e dos Estados Unidos da América.
No antigo Teatro Micaelense (na foto), estas sessões adquiriram, rapidamente, enorme entusiasmo e adesão por parte da sociedade micaelense, cenário que o texto abaixo ilustra de modo pitoresco:
«No proximo domingo realisa-se um espectaculo cinematographico no theatro d'esta cidade pela empreza Santos & C.ª, cuja vontade em bem servir o publico continua a ser manifesta.
(...)
A acertada escolha dos assumptos a expor, já em arte, phantasia, panoramas e factos sensacionaes da actualidade, que a empreza Santos & C.ª tem feito nos seus pedidos ás melhores casas nacionaes e estrangeiras, fornecedoras de fitas de cinematographo, está a comprovar-se pelo bom acolhimento que n'esta epoca o publico tem feito aos seus espectaculos.
Nota-se, de facto, uma evidente tendencia da nossa população para assistir a este passatempo instructivo, muitas vezes alegre, essencialmente educador e economico. E no nosso meio, onde a falta de divertimentos populares e baratos é absoluta, a tentativa d'esta empreza, veiu preencher d'algum modo essa lacuna.
Alem d'isto esta forma de diversão está muito a carater com o nosso modo de ser, que evidentemente se desvia do espalhafato e da bulha. Somos um povo ordeiro e pacato, e por isso buscamos qualquer coisa que nos distraia sem desordem.
Que melhor pois podiamos achar para satisfazer o nosso feitio organico do que estes espectaculos? Nada, a não ser este admiravel evento de Edison.
Depois uma população trabalhadora que moireja uma semana inteira, chega ao domingo ansiosa por qualquer coisa que a distraia, mas sem muito incommodo. É o caso:
Não há etiquetas, e d'ahi o bem estar pela completa despreocupação de nós mesmos. Chega-se ali á bilheteira, compra-se um logar com pouco dinheiro, á hora marcada lá estamos mais ou menos comodamente sentados a ver passar ante os nossos olhos variadissimas scenas, que saltam do jocoso ao tetrico, do futil ao scientifico, do interessante a banal, da phantasia ao real.
E por isso mesmo, porque o nosso espirito varia constantemente, é que estes espectaculos de cinematographo nos prendem.
O publico d'esta cidade já esta affeito a elles e cada vez mais os frequenta como vêmos pela esplendida concorrencia que ultimamente teem tido. Decerto que muito para isto tem concorrido a empreza, que se não poupa a esforços, e que é digna da sua affluencia.»
in Diário dos Açores, 29 de Outubro de 1909, n.º5510, p.2
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