Breve resumo dos principais filmes visualizados esta semana:
. ÉDEN
. CRAZY HORSE
. INTO THE ABYSS
. VOL SPÉCIAL
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. ÉDEN (2011), de Daniel Blaufuks
Um olhar sobre as décadas de 40 e 50 — a idade de ouro da exibição cinematográfica em Cabo Verde — através do imaginário contemporâneo de uma sala de cinema abandonada.
Memórias de arcos voltaicos desactivados, ruínas de um ecrã onde há muito não se projectam imagens em movimento e vestígios de produções cinematográficas na ilha de São Vicente movidas por paixão ao Cinema são invocados pelo magnífico e pertinente olhar documentarista de Daniel Blaufuks, elaborando assim um genuíno tratado sobre a influência da Sétima Arte nas vivências de povos arquipelágicos ("o mar e o Cinema eram a única forma de sair da ilha", tal como se lê no title card com que o filme arranca) e de uma forma de encarar o grande ecrã que já não se experiencia actualmente.
Pela nostalgia que representa, sem nunca cair em facilitismos emocionais, é obrigatório para amantes de cinema, seja ele o de hoje ou o de ontem.
. CRAZY HORSE (2011), de Frederick Wiseman
Filmado ao longo de dez semanas, permite um acesso total ao perfeccionismo, à exigência e à elegância, que se escondem por detrás da imagem do lendário espectáculo Crazy Horse.
A qualidade sensual e criativa dos espectáculos produzidos no cabaré mais famoso do mundo não constitui, mesmo para quem nunca o visitou, particular novidade, mas a câmara de Frederick Wiseman não deixa de a captar (excelente direcção de fotografia de John Davey, colaborador de longa data do realizador) e de se seduzir por ela.
Contudo, estamos perante um registo que nunca abdica do mero estatuto de comentário visual a performances que almejam — de acordo com os seus directores artísticos — "celebrar uma noção quase platónica de beleza feminina e expressão autónoma do erotismo da mulher". Mas a desglamourização do Crazy Horse, patenteada na sequência que filma as audições de bailarinas, nas quais privilegia-se mais a curvatura do rabo do que o talento para a dança das candidatas, descortina o interessante caminho que este filme poderia e, em prol de alguma astúcia documental, trilhar.
. INTO THE ABYSS (2011), de Werner Herzog
As conversas com Michael Perry, condenado à morte, e com os afectados pelo seu crime, ilustram uma análise das razões porque as pessoas — e o Estado — matam.
Subjacente ao seu tom filosófico consistente e, a espaços, pungente, reside uma observação mordaz ao peso que as relações familiares e circunstância social exercem na construção da auto-estima de um indivíduo — e não necessariamente a do condenado à morte salientado em INTO THE ABYSS, a quem Herzog cedo confessa que, e embora sendo um opositor da pena capital, não ser obrigado a simpatizar.
É aqui que se depreende a principal intenção do documentário: mais do que um manifesto "anti-corredor da morte", está a contundente análise do falhanço das sociedades modernas, onde se assassina por móbiles absolutamente insignificantes, as tragédias geram naturezas diferentes de humanismo e o humor tem tanto de inesperado como de confrangedor. De visualização recomendada.
. VOL SPÉCIAL (2011), de Fernand Melgar
Enquanto aguardam deportação da Suíça, imigrantes ilegais ficam encarcerados no centro de detenção Frambois, onde podem permanecer durante anos até lhes ser proporcionada a viagem de regresso ao país de origem. Quando se recusam a partir, são algemados e conduzidos à força para o interior de um avião. Ou seja, um "voo especial".
Retrato pragmático e austero de frieza burocrata onde menos se esperaria — sim, esta é a Suíça da Cruz Vermelha e da sua apregoada Democracia Directa —, capta, em pormenor e rigor, os dramas, histórias e personalidades singulares de um grupo de detidos de Frambois.
Apesar desse cuidado, é de lamentar que Melgar não tenha abordado os contornos político-sociais da realidade apresentada. Muito se poderia dizer, documentalmente, sobre os prós e contras de sufrágios populares (a criação destes "voos especiais" é fruto de um referendo nacional) ou da dúbia mecânica diplomática inerente a estas deportações. Uma timidez que penaliza os propósitos de VOL SPÉCIAL. Mas, "filme fascista" ou não, merece ser conhecido.
domingo, abril 22, 2012
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2 comentários:
Entre estes quatro filmes a minha curiosidade ficou toda direccionada para Éden. Estou com grande vontade de o ver.
Óptimas críticas, uma vez mais, Sam.
Cumprimentos cinéfilos *
Obrigado pelas tuas palavras, Inês.
Ainda bem que consegui cativar-te para o ÉDEN, é mesmo fascinante! :)
Cumps cinéfilos *
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