quarta-feira, maio 30, 2012

O BARÃO (2011), de Edgar Pêra



Baseado na novela homónima de Branquinho da Fonseca e no conto "O Involuntário", do mesmo autor, O BARÃO retrata a vida de um barão, ditador e caciquista, arrogante e controlador, misógino e cruel, uma personagem draculesca raramente vista no cinema português.



Visto que este é um filme (e em 2D!) de Edgar Pêra, O BARÃO é 90% atmosfera e 10% história. E que extravagante atmosfera! Revelando-se moderno pelo seu visual retro (muito mérito para a fotografia de Luís Branquinho e a direcção artística de Fernando Areal), é impossível descrever o filme sem realçar as influências que exibe — de Jean Cocteau a David Lynch, de F.W. Murnau a Guy Maddin, de Jean Epstein a E. Elias Merhige —, salientar a diversidade de técnicas aplicadas — planos de câmara expressionistas, dissolves, overlaps, distorções de imagem, a criativa legendagem dos diálogos em Inglês e a permanente dúvida de ter sido filmado em película — e evidenciar como se trata de uma experiência cinematográfica única. E não só no panorama nacional.

Denotando apelo universal para qualquer espectador interessado em cinema experimental, a narrativa de O BARÃO, pouco preocupada em coerência e linearidade mas mormente equilibrada neste contexto imagético, é intrinsecamente portuguesa. Pela sua fonte literária, a metáfora ao cinzentismo e repressão salazaristas são imediatamente apreensíveis e a abundância de referências (religiosas, supersticiosas, os "senhores doutores" de Coimbra, etc.) a paradigmas nacionais demonstram que estamos perante algo definitivamente luso.

Destaque obrigatório para o protagonista. Num registo que mistura o Klaus Kinski de NOSFERATU, O FANTASMA DA NOITE (1979, Werner Herzog) com Gary Oldman em DRÁCULA DE BRAM STOKER (1992, Francis Ford Coppola), este Barão pertence definitivamente a Nuno Melo: pela forma cavernosa como debita as deixas mais emblemáticas do filme, pelos esgares vampirescos que nunca se assemelham a overacting, na sua omnipresença mesmo quando não ocupa tempo de ecrã, o actor conquista aqui a sua imortalidade na História do Cinema Português.

De visualização muito recomendada.

2 comentários:

Inês Moreira Santos disse...

Mais do que recomendada, a visualização deste filme deveria ser mesmo obrigatória. Um filme excelente que passou ao lado da grande maioria do público nacional, e mesmo dos cinéfilos.
Para mim é provavelmente o melhor filme português do ano passado. Bom, tu conheces a minha predilecção por ele.
Destaque mais do que merecido para Nuno Melo, que provou aqui o GIGANTE actor que é, se é que ainda restavam dúvidas.

Excelente crítica, Sam.
Cumprimentos cinéfilos :*

Sam disse...

Inês, por saber da tua predilecção relativamente a O BARÃO, foi, e é, um prazer debatê-lo contigo.

Mais do que o ano passado, já tem lugar cativo entre as melhores e mais interessantes obras cinematográficas portuguesas desta década. Penso que ainda se vai falar muito dele nos tempos vindouros.

E eu já não tinha dúvidas nenhumas acerca do talento do Nuno Melo!

Obrigado pelo teu comentário.
Cumps cinéfilos :*

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