domingo, outubro 16, 2011

Críticas da Semana

Breve resumo dos principais filmes visualizados esta semana:

. SANGUE DO MEU SANGUE
. MEIA-NOITE EM PARIS
. WHORES' GLORY
. É NA TERRA NÃO É NA LUA

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. SANGUE DO MEU SANGUE (2011), de João Canijo

Uma família de classe média, residente no Bairro Padre Cruz em Lisboa, vê a serenidade do seu quotidiano abalada, obrigando ao amor incondicional, sacrifício e redenção entre mãe (Rita Blanco), irmã (Anabela Moreira) e filha (Cleia Almeida).



Sem expor um argumento inteiramente original (há aqui muito de, por exemplo, Pedro Almodóvar ou Mike Leigh) nem desejando formular qualquer tipo de denúncia económico-social, Canijo consolida o seu estatuto de formidável inovador na observação de hábitos e costumes lusos. Apostando no realismo de cenários e personagens, a artificialidade encontra-se nos minuciosos planos-sequência do filme e num espantoso trabalho de sonoplastia que, muitas vezes, apresenta ao espectador três situações — naquilo que não resisto em apelidar de "tridimensionalidade de som" — a decorrer, em simultâneo, na mesma meia dúzia de metros quadrados.

SANGUE DO MEU SANGUE pertence, brilhante e irremediavelmente, às suas actrizes: impecáveis Rita Blanco (numa versão emancipada da sua Margarida Lopes na série televisiva CONTA-ME COMO FOI), Anabela Moreira e Cleia Almeida, sem temor do reconhecimento de culpa nem da humilhação perante um elenco masculino muito eficaz na composição de homens com "h" pequeno...

É o melhor filme português de 2011 — e pelo contexto temporal, dificilmente será destronado desse título.

. MEIA-NOITE EM PARIS (2011), de Woody Allen

Um casal (Owen Wilson e Rachel McAdams), prestes a casar, viaja para Paris e encontrará um conjunto de experiências que lhes muda a vida: ela reencontra um antigo professor (Michael Sheen); ele descobrirá a magia da capital francesa quando soa a meia-noite.



É o filme do "regresso" para Woody Allen. Não à sua nativa e querida Nova Iorque, mas ao brilhantismo na concepção de situações e diálogos como há muito não o víamos fazer. Desde a acutilante observação histórica de BALAS SOBRE A BROADWAY (1994), passando pelo surrealismo quase imperceptível de AS FACES DE HARRY (1998), até aos constantes dilemas da criação artística, expostos num argumento simples e sem pretensões de não ser mais do que uma comédia romântica.

O seu maior atractivo reside, sem dúvida, nos episódicos encontros do protagonista com figuras históricas que povoaram Paris durante os anos 20 — Hemingway, Dali, Fitzgerald —, os quais elevam o filme da mediania e tornam-no absolutamente inesquecível. Para rever.

. WHORES' GLORY (2011), de Michael Glawogger

Um tríptico cinematográfico sobre prostituição: três países (Tailândia, Bangladesh, México), três idiomas, três religiões, três realidades díspares onde o acto humano mais íntimo se transformou num objecto comercial... sujeito a negociação.



Poder-se-à falar de "documentário atmosférico"? Pois é essa a maior conclusão que se depreende de WHORES' GLORY. Não menosprezando os — corajosos e, portanto, impressionantes — testemunhos de quem exerce "a profissão mais velha do mundo", a realização de Glawogger concentra-se em demonstrar visualmente a complexidade e espírito de sacrifício inerentes à prostituição.

Filmado num estilo semelhante ao de um filme de ficção (nomeadamente, e na parte final, a completa e explícita interacção entre uma prostituta e o seu cliente que quase parece encenada), rejeitando qualquer tipo de solidariedade social e comparando, de modo pertinente, prostituição aos vícios da globalização, este revela-se como um dos documentários mais audaciosos, provocantes e verdadeiramente mind changing dos últimos anos. Muito recomendado.

. É NA TERRA NÃO É NA LUA (2011), de Gonçalo Tocha

Em 2007, um engenheiro de som e um cameraman chegam ao Corvo, a ilha mais pequena do arquipélago dos Açores. Gradualmente, são aceites pela população e descobrem 500 anos de civilização, cuja História é praticamente indecifrável e/ou inexistente.



Narrado a duas vozes, inefáveis em partilhar os momentos mais curiosos da sua rodagem, é uma obra singular e de constante descoberta, sem precipitar a revelação — os 180 minutos de duração comprovam-no... — das vidas e costumes dos 450 habitantes do Corvo, tão obscuros e distantes quanto a sua localização geográfica.

Apenas se lamenta que Gonçalo Tocha não tenha resistido em compor tantos postais turísticos da ilha do Corvo. Por mais bonitas que sejam, essas imagens revelam-se, a partir de certa altura, repetitivas e cansativas: e num filme com esta metragem, eis um pormenor deveras importante para a maioria dos espectadores. O interesse de É NA TERRA NÃO NA LUA encontra-se, isso sim, nos rostos, no português cerrado e na felicidade latente dos corvinos. Não poderia haver melhor pretexto para se querer visitar o Corvo.

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