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terça-feira, abril 16, 2013

O Cinema dos Anos 2000: O Pianista, de Roman Polanski




Roman Polanski deixou o mundo atordoado em 2002 com o seu perturbador e realista O PIANISTA. Vencedor de três Oscars das sete categorias onde esteve nomeado, a longa-metragem relata acontecimentos da Segunda Guerra Mundial pelo olhar de quem a vivenciou — não somente do pianista Wladyslaw Szpilman, mas também do próprio realizador que viveu, na primeira pessoa, alguns dos acontecimentos de O PIANISTA.

Este tom duplamente autobiográfico confere, desde logo, à obra de Polanski, uma aura que a distingue de outros filmes que relatam a mesma época histórica, criando uma proximidade e tocando profundamente a plateia. Ao mesmo tempo, o protagonista não poderia ser melhor — exemplarmente escolhido pelo realizador —, Adrien Brody tem um desempenho arrepiante, vestindo a pele, de corpo e alma, a uma personagem exigente, tanto física como psicologicamente. O actor é o rosto do sofrimento, da perda, do vazio de uma Polónia devastada, e, ao mesmo tempo, representa a força e coragem de quem luta, contra tudo o que o poderia fazer desistir.

O PIANISTA é um retrato de humanidade, que mostra, sem qualquer receio, as atrocidades de que o Homem é capaz, num paradoxo capaz de emocionar. A banda sonora, composta por Wojciech Kilar, faz adensar o ambiente de tragédia e desolação que se vive do início ao fim, mas, ao mesmo tempo, inunda O PIANISTA de sensações e de uma força sem igual. A música, essa, está sempre presente, mesmo à margem da banda sonora, na própria personagem de Wladyslaw Szpilman, que mesmo resignado ao silêncio faz ouvir o som das suas teclas invisíveis.

A realização de Polanski arrisca e, aliada à direcção de fotografia, de Pawel Edelman, proporciona cenas inesquecíveis, numa Polónia escura e gelada — as cores neutras abundam —, em ruínas, e onde a guerra e a morte espreitam por toda a parte. Um dos momentos mais tocantes da película — se é que se pode destacar apenas um — é quando Szpilman toca piano para um oficial alemão, numa sala escura, onde um único foco de luz espreita por entre as cortinas e ilumina a cabeça do pianista, num subtil prenúncio do que o espera no futuro.

Roman Polanski trouxe em O PIANISTA um dos mais marcantes filmes da primeira década do século XXI, que se tornará, inevitavelmente, parte da História da Sétima Arte. Envolvente, brutal e cruel, um fiel retrato de uma dura realidade escrita na História Mundial.

por Inês Moreira Santos (Hoje Vi(vi) Um Filme, editora de cinema do Espalha-Factos).

Elenco
. Adrien Brody (Władysław Szpilman), Thomas Kretschmann (Capitão Wilm Hosenfeld), Frank Finlay (Pai Szpilman), Maureen Lipman (Mãe Szpilman), Ronan Vibert (Andrzej Bogucki), Ruth Platt (Janina Bogucki), Emilia Fox (Dorota)


Palmarés
. Oscars da Academia: Melhor Realizador (Roman Polanski), Melhor Actor Principal (Adrien Brody), Melhor Argumento Adaptado (Ronald Harwood)
. BAFTA: Melhor Filme, Prémio David Lean — Melhor Realizador (Roman Polanski)
. Césares: Melhor Filme, Melhor Realizador (Roman Polanski), Melhor Actor (Adrien Brody), Melhor Fotografia (Pawel Edelman), Melhor Direcção Artística (Allan Starski), Melhor Banda Sonora (Wojciech Kilar), Melhor Som (Jean-Marie Blondel, Gérard Hardy, Dean Humphreys)
. Prémios da Academia Europeia: Melhor Fotografia (Pawel Edelman)
. Prémios Goya: Melhor Filme Europeu (Roman Polanski)
. Festival de Cannes: Palma de Ouro — Melhor Filme (Roman Polanski)
. Fotogramas de Plata: Melhor Filme Europeu (Roman Polanski)
. Prémios Sant Jordi: Melhor Filme Estrangeiro (Roman Polanski)
. National Society of Film Critics: Melhor Filme, Melhor Realizador (Roman Polanski), Melhor Actor (Adrien Brody), Melhor Argumento (Ronald Harwood)


Sobre Roman Polanski

Vagueando por géneros e temas diversos, numa abordagem narrativa pessimista, cruel e sombria (canalizada a partir das suas próprias amargas experiências enquanto jovem), Polanski tem imprimido uma marca única na Sétima Arte com títulos como A FACA NA ÁGUA (1962), REPULSA (1965), A SEMENTE DO DIABO (1968), CHINATOWN (1974), TESS (1979) e O ESCRITOR FANTASMA (2010). As tribulações da sua vida privada, desde o homicídio da sua então esposa Sharon Tate, em 1969, até às acusações de abuso sexual de uma menor, também fomentaram a popularidade de um artista procurado pela lei, mas desejado por admiradores de Cinema sempre perturbador.



domingo, janeiro 01, 2012

Críticas da Semana

Breve resumo dos principais filmes visualizados esta semana:

. O DEUS DA CARNIFICINA
. TEXAS KILLING FIELDS
. MONEYBALL
. BELLFLOWER

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. O DEUS DA CARNIFICINA (2011), de Roman Polanski



Os Longstreet (John C. Reilly e Jodie Foster) e os Cowan (Christoph Waltz e Kate Winslet) reúnem-se civilizadamente para conversar a propósito duma cena de violência entre os dois filhos de onze anos. E, no decorrer de uma tarde, os dois casais revelam a sua verdadeira natureza.



Na sua génese, O DEUS DA CARNIFICINA era um projecto cinematográfico com todos os ingredientes para a concepção de um filme electrizante em todos os sentidos: elenco infalível, fonte literária mordaz e apurada e o background de Polanski na adaptação de peças de teatro (veja-se o impressionante mas sonegado pelo decorrer dos anos A NOITE DA VINGANÇA) e proficuidade narrativa em espaços exíguos (patenteado em REPULSA ou O INQUILINO).

Surpreendentemente, esta verborrágica demonstração de inumanidade urbana não ganha muito com a sua transposição para o grande ecrã, deixando-nos perante um filme pouco "cinemático". Em contrapartida, temos a exibição de talento por parte do elenco (sobretudo o inevitável Christoph Waltz, numa divertidíssima composição de white trash capitalista e incapaz de largar o telemóvel mesmo quando a discussão atinge níveis incendiados) e a nossa atenção irremediavelmente virada para a acutilância dos diálogos, os quais são a força motriz de um título capaz de reacender o debate sobre o carácter filmíco de algumas produções teatrais. Já agora, estejam atentos a mais um muito discreto cameo do próprio Roman Polanski...

. TEXAS KILLING FIELDS (2011), de Ami Canaan Mann



Nos pântanos de uma pequena localidade do Texas, um detective local (Sam Worthington) forma parceria com Brian Heigh (Jeffrey Dean Morgan), um polícia de Nova Iorque, para investigar e solucionar uma série de homicídios.



Primeiro filme de Ami Canaan Mann, filha do também realizador Michael Mann, é uma obra onde abundam os tiques de estreante e a influência genética de quem deseja seguir "trajectos paternais". E embora tenhamos a adequada atmosfera suja e húmida do sul do Texas, parecendo emular, a espaços, um episódio de TWIN PEAKS (e isso muito antes de percebermos que Sheryl Lee integra o elenco), o argumento é um caos de relações mal desenvolvidas e pontas soltas em demasia.

Indeciso entre um comentário sobre a anarquia inerente a qualquer investigação criminal no seio de uma comunidade suburbana conservadora e os esforços da justiça para a resolução de um caso particular de violência doméstica, TEXAS KILLING FIELDS sofre, acima de tudo, por não ter apostado na velha fórmula do "quanto mais simples melhor" — a sua "dimensão" afecta também as interpretações, não sendo possível destacar quem está, neste contexto, mais inspirado. Num filme pelo qual nutria expectativas elevadas, acaba por me "consolar" a probabilidade de, num futuro próximo, ser-nos disponibilizado o seu director's cut.

. MONEYBALL (2011), de Bennett Miller



A história de Billy Beane (Brad Pitt), director desportivo da equipa de beisebol Oakland A's, que procura compensar um orçamento reduzido para transferências de jogadores com a aplicação de análise estatística e informática para recrutar os melhores talentos disponíveis.



Título apropriado para fãs de Brad Pitt e/ou de beisebol (e estejam atentos para a sua presença nas principais atribuições de prémios que agora se avizinham), MONEYBALL é um daqueles exemplos flagrantes de filme sobre vitórias morais com um determinado enquadramento — neste caso, o desportivo — como pano de fundo sem nunca conseguir elevar-se da mediania sobrevalorizada.

Não sendo desprovido dos seus momentos distintos — o detalhar do método matemático para a constituição de uma equipa de beisebol vencedora ou a sugestão de como a neurose supersticiosa do general manager protagonista pode influenciar o desenlace de um jogo são pautados por um trabalho de montagem muito eficaz — e de uma interpretação segura (quem sabe, premiada) por parte de Brad Pitt, MONEYBALL sofre, acima de tudo, da "estranheza" que o seu assunto poderá encontrar fora dos EUA (frases como «He gets on base a lot» serão autênticos mistérios para mim até ao dia em que me inteirar das regras da modalidade...) e de uma metragem desnecessariamente longa. Todavia, recomenda-se a visualização.

. BELLFLOWER (2011), de
Evan Glodell



Dois amigos (Evan Glodell e Tyler Dawson) decidem concretizar um sonho de infância inspirado em MAD MAX: construir um carro apetrechado de lança-chamas e garantir, assim, a sua sobrevivência quando o "Apocalipse" acontecer. Entretanto, um deles apaixona-se e enceta numa viagem de traição, ódio e infidelidade com consequências extremas.



Encarem-no como uma "resolução de Ano Novo", mas passarei a dar, sem reservas, nota muito positiva a todo o filme que se revelar tão visualmente impressionante e semi-inovador quanto este BELLFLOWER, cuja estética aparenta soçobrar a vacuidade de uma história que explode (literalmente, aliás) na sua última meia-hora. Obra de intensa paixão, energia e carácter pessoal — note-se que o realizador também é aqui a personagem principal —, confunde deliberadamente o espectador através da sua narrativa não-linear, linhas temporais alternativas e ausência de motivações dos intervenientes para culminar numa das mais arrepiantes "dor de corno" a que assisti em tempos recentes.

Embora o argumento não esteja livre de falhas — e quando Glodell tiver um em seu poder que não as tenha, então veremos mesmo algo de realmente único —, o seu esquema cromático onde o amarelo-quente é predominante, o seu pragmatismo trágico digno de Michael Haneke e as suas referências pop tornam-no num projecto a não perder de vista. Mesmo que ainda não possua data prevista de estreia em Portugal...

sábado, setembro 10, 2011

Venice Buzz



Faltam poucas horas para o anúncio dos principais galardoados da 68ª edição do Festival de Veneza.

Independentemente do que o júri presidido pelo realizador Darren Aronofski deliberar, aqui ficam dez dos filmes mais bem recebidos pela crítica durante o certame.

Títulos a ter em atenção, e não só para os prémios...

. TINKER, TAILOR, SOLDIER, SPY (Alemanha/EUA), de Tomas Alfredson



«Right here, right now, it's the film to beat at this year's festival.»
Xan Brooks, Guardian.

. THE IDES OF MARCH (EUA), de George Clooney



«A political thriller exploring themes of loyalty, ambition and the gap between public ideals and private fallibility, it engages the brain within the context of a solid entertainment.»
David Gritten, Telegraph.

. A DANGEROUS METHOD (Alemanha/Canadá), de David Cronenberg



«Precise, lucid and thrillingly disciplined, this story of boundary-testing in the early days of psychoanalysis is brought to vivid life by the outstanding lead performances of Keira Knightley, Viggo Mortensen and Michael Fassbender.»
Todd McCarthy, Hollywood Reporter.

. TAO JIE (A SIMPLE LIFE) (China/Hong Kong), de Ann Hui



«Susan Chan and Roger Lee's script is a bittersweet, unmistakably heartfelt look at ties between people who aren't blood relations but who have in effect a mother/son bond.»
Neil Young, Hollywood Reporter.

. ALPS (Grécia), de Giorgos Lanthimos



«It'd be rash to call it a better film than DOGTOOTH, but it is, in the relative scheme of these things, a bigger one, and exciting evidence of restless formal development on the part of its director.»
Guy Lodge, In Contention.

. SHAME (Reino Unido), de Steve McQueen



«[...] a formidable, and formidably sober, provocation.»
Jonathan Romney, Sight & Sound.

. L'ULTIMO TERRESTRE (Itália), de Gian Alfonso Pacinotti



«Loosely inspired by a collection of comics from colleague Giacomo Monti, pic cleverly uses its sci-fi elements to explore people's fear of diversity and the unknown.»
Boyd Van Hoeij, Variety.

. FAUST (Rússia), de Alexander Sokurov



«[...] and since we are yet before hell, the path to get there is, remarkably, a vibrantly soulful, terrible and funny feast.»
Daniel Kasman, MUBI.com.

. WUTHERING HEIGHTS (Reino Unido), de Andrea Arnold



«Full credit to director Andrea Arnold for taking such a bold and distinctive approach to Emily Brontë's account of sweeping passion on the Yorkshire moors.»
Xan Brooks, Guardian.

. CARNAGE (Alemanha/Espanha/França/Polónia), de Roman Polanski



«Snappy, nasty, deftly acted and perhaps the fastest paced film ever directed by a 78-year-old, [CARNAGE] fully delivers the laughs and savagery of the stage piece while entirely convincing as having been shot in New York, even though it was filmed in Paris for well-known reasons.»
Todd McCarthy, Hollywood Reporter.

segunda-feira, agosto 15, 2011

Um blogger vai de férias...



...e quando regressa, descobre que:

. faleceram Richard Pearson, Annette Charles, Francesco Quinn e Silvio Narizanno;

. Zoë Saldana protagonizou esta estonteante sessão fotográfica para a revista Flaunt;

. Jonathan Demme é o realizador escolhido para adaptar ao grande ecrã o romance, de Stephen King, sobre o assassinato de John F. Kennedy;

. James Franco vai realizar um documentário sobre a indústria do cinema pornográfico;

. o próximo projecto de David Cronenberg é uma adaptação do romance As She Climbed Across the Table, de Jonathan Lethem;

. o primeiro poster de CARNAGE, o novo filme de Roman Polanski, é de uma simplicidade, criatividade e apelo irresistíveis;

. Ridley Scott envereda agora pelo universo dos videogames, estando a desenvolver conteúdos para a nova edição do jogo 'Call of Duty';

. a Cinemateca Portuguesa vai retomar as cinco sessões diárias já em Setembro.

Silly season? Por este balanço, muita e interessante actividade se desenrolou durante a ausência do regressado Keyzer Soze...

quinta-feira, julho 07, 2011

#16



... segundo o Jorge Rodrigues, do Dial P For Popcorn:

1. 2001: ODISSEIA NO ESPAÇO
(1968, 2001: A Space Odyssey, Stanley Kubrick)



O mais admirável e grandioso, para mim, da riquíssima filmografia de Kubrick, este filme é uma experiência sensorial fascinante, que junta, de forma maravilhosa, riqueza visual e portento sonoro. Uma ode a uma técnica prodigiosa, este é sem dúvida o filme que me mostrou a mim que nunca haverá um realizador tão dotado e visionário como este. Uma obra-prima imortal.

2. 8½
(1963, , Federico Fellini)



Contado da perspectiva do realizador (cuja personagem, subentende-se, é uma encarnação do próprio Fellini, supostamente perdido na sua carreira), este é o melhor filme que já vi sobre cinema. Relatando a história privilegiando imagem sobre conteúdo, baseando todo o filme no limbo entre a fantasia e a realidade, o processo de Fellini é irrepreensivelmente fascinante, quase mágico até – ele revela, ele desconstrói, ele só mostra o que nos quer deixar ver. Este é um filme para se deixar levar – e se maravilhar. Quando termina, faz-nos sentir como se tivéssemos chegado de uma viagem longa mas surreal.

3. EVA
(1950, All About Eve, Joseph L. Mankiewicz)



Rico em discussões, discórdias e confusões, cheio de inteligência, elegância, fluidez e muita personalidade, um argumento sagaz e muito perspicaz na forma como analisa os bastidores do teatro e da fama e celebridade e um confronto que faz a tela pegar fogo. Na teoria, este filme tinha tudo para dar certo. Mankiewicz e o elenco deram 100% de si mesmo para assegurar a universalidade e a pertinência deste filme para muitos séculos que hão-de vir.

4. ANDREI RUBLEV
(1966, Andrey Rublyov, Andrei Tarkovskiy)



Brilhante em termos técnicos, de ritmo deliberadamente lento, uma história fascinante na forma como retrata a Rússia do século XV, ANDREI RUBLEV o filme mais enigmático e complexo do genial Tarkovsky, é pura poesia cinematográfica, uma película surpreendente sobre a transcendência na arte, na fé, na vida.

5. CHINATOWN
(1974, Chinatown, Roman Polanski)



Um thriller noir nada convencional que vive muito da capacidade perceptiva e mestria do grande realizador Roman Polanski (em topo de forma aqui, naquele que é o seu maior trabalho) e da interpretação fabulosa tanto de Jack Nicholson como de Faye Dunaway. Nota-se na forma cuidada como cada frame está disposto (uma composição imaculada), na subtileza de vários detalhes e na forma como o filme nos prende do princípio ao fim, envolvendo-nos numa trama sem par.

6. O MUNDO A SEUS PÉS
(1941, Citizen Kane, Orson Welles)



Tecnicamente perfeito, não desperdiçando um segundo sequer de película, exuberante na forma profunda como narra o passado de Charles Foster Kane, que ensina uma valiosíssima lição sobre a vida: nós só sobrevivemos nas memórias dos outros, não no que outrora possuímos ou fizemos. Seremos imortais porque assim nos tornámos no imaginário das pessoas. Charles Kane era um simples homem — mas na mente dos outros, tornou-se mais do que isso. A história extraordinária de um homem tão singular e único, CITIZEN KANE funciona como uma revelação, como um épico que de épico nada tem e que fica para sempre nos anais da história como um dos maiores filmes que o cinema alguma vez produziu.

7. ANA E SUAS IRMÃS
(1986, Hannah and Her Sisters, Woody Allen)



O filme mais maduro do enorme contador de histórias, narrador de neuroses suburbanas e de relacionamentos periclitantes que é Woody Allen, HANNAH AND HER SISTERS convence por ser genuíno, por ter um coração tão grande quanto a profundidade comédica do seu argumento, por aliar tão bem o intelectual com o enérgico, por retratar de forma tão curiosa e tão autêntica as complexas relações entre três irmãs e as várias pessoas que giram e se interconectam nas suas vidas. Apaixonante, igualmente divertido e sério, sobretudo sincero e honesto, este é o Woody mais completo que eu já vi.

8. NASHVILLE
(1975, Nashville, Robert Altman)



Nunca vi um filme como este e nunca mais, suspeito eu, irei ver. Robert Altman é único e este NASHVILLE é a sua obra-prima mais Altmanesca. Um elenco sublime e todos com participações gloriosas, num entrelaçar de várias histórias compilado que ajuda e muito na construção da atmosfera colorida, envolvente e tão peculiar pela qual a grande cidade do Tennessee, capital mundial da música country (que também tem um grande papel no filme), é universalmente conhecida e que o filme tão bem retrata. Influente, inspirador, desafiador de convenções, NASHVILLE é um dos clássicos modernos mais importantes do nosso tempo.

9. A MÁSCARA
(1966, Persona, Ingmar Bergman)



Hipnótico, complexo, absorvente, profundo, perfeito, PERSONA é a maior obra-prima do gigante do cinema universal que é Ingmar Bergman. Filmado experimentalmente a preto e branco, um exercício artístico assumido desde logo por parte do auteur, PERSONA impressiona e marca tanto pela sua simplicidade de conteúdo como pela complexidade das suas personagens e da relação estabelecida entre elas. Profundamente emocional, é uma experiência que dificilmente irei esquecer.

10. MADAME DE...
(1953, Madame de..., Max Ophüls)



Uma rica composição, excelente a conferir atmosfera e exímio na forma como explora a amplitude de movimentos da câmara, impressionante em termos visuais, esta obra-prima inesquecível de Ophüls, notável connaisseur do espaço e da emoção, capaz de criar o mais incrível dos dramas a partir da mais singela e vulgar ideia, hábil realizador consumido pela sua curiosidade e fixação pelos seus sujeitos, eternamente conhecido como o virtuoso cineasta do romance, é uma belíssima e arrebatadora experiência catártica.

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Obrigado, Jorge, pela tua participação!

domingo, dezembro 26, 2010

2010: Os Melhores

E chegamos à inevitável (e muito tramada!) época de balanço do ano que agora termina. Como já é tradição, deixo-vos com o Top 10 dos melhores filmes estreados em Portugal durante 2010, de acordo com o Keyzer Soze:

10º ex-aequo
UM HOMEM SINGULAR



A primeira experiência de Tom Ford como realizador é uma obra cinematográfica por excelência. A elaborada direcção artística funciona em prol do argumento, abundam os qualitativos pormenores de fotografia, montagem, guarda-roupa e maquilhagem a espelharem os estados de espírito das personagens e um Colin Firth assombroso na pele da personagem mais pesarosa que preencheu um grande ecrã este ano.



FANTASIA LUSITANA



Documentário que na análise da propaganda salazarista durante os anos da Segunda Guerra Mundial, mostrando a neutralidade de Portugal como um paraíso de paz no seio de uma Europa em devastador conflito, procura referências de comparação com o actual estado da Nação. No seu minimalismo de imagens e sons (o filme não tem narrador), João Canijo impele o espectador a tirar as suas próprias conclusões.




ANTICRISTO



A controvérsia gerada em Cannes — onde lhe foi atribuído um "anti-prémio" — era suficiente para se perceber que Lars von Trier não iria abandonar a sua infâmia muito própria. E, na verdade, o dinamarquês realizou um dos títulos mais poderosos do ano, uma obra-prima de grotesco cinematográfico. Willem Defoe e Charlotte Gainsbourg, sem medo da exposição ou do rídiculo gratuitos, mantêm o argumento (e o interesse de quem assiste) coeso de uma ponta à outra do filme.




O SÍTIO DAS COISAS SELVAGENS



O filme fantástico para todas as idades do ano — que me perdoem os fãs da ALICE de Tim Burton —, Spike Jonze desenvolve o conto infantil de Maurice Sendak e dá vida à sagaz imaginação de um rapaz de oito anos que se torna rei de uma ilha povoada por criaturas peludas (magníficas e realistas composições digitais) que demonstram idiossincrasias próprias dos adultos.




THIRST — ESTE É O MEU SANGUE...



Chan-wook Park prossegue a sua corajosa e original carreira com uma fresca abordagem ao (sempre em voga) mito do vampiro, mas sem abdicar dos motivos próprios do género, usando o tema — e um padre católico como protagonista — para dissertar acerca do que nos torna humanos. Capaz de se mostrar surreal, espirituoso, visceral e sensual numa única cena, foi dos filmes mais pujantes do ano.




TOY STORY 3



Não há uma única emoção que tenha ficado esquecida: da genuína alegria à honesta comoção e capaz de nos encantar pelo seu deslumbramento visual, nenhum espírito é suficientemente empedernido para deixar de se convencer da maturidade artística alcançada pela dupla Disney/Pixar. A trilogia que definiu a animação concebida por computador encerra com genial chave de ouro.




LÍBANO



Desde O RESGATE DO SOLDADO RYAN que nenhum filme colocava o espectador tão intimamente na linha de fogo dum conflito armado. Totalmente situado no interior de um blindado que acompanha quatro soldados israelitas durante a Guerra do Líbano, em 1982, esta é uma obra de criativa audácia, rigorosa seriedade moral e, acima de tudo, uma experiência cinematográfica inesquecível. Ou tudo aquilo que um war movie deve ser.




A ORIGEM



O padrão de como um blockbuster deve apresentar-se: visualmente atraente, narrativamente inteligente, profundamente envolvente e totalmente satisfatório. Na verdade, existem poucos adjectivos para louvar a dimensão aplicada a um argumento que assume diversos riscos — quer na sua coerência como na capacidade de gerar receitas de bilheteira — do princípio ao fim das suas duas horas e meia de duração.




UM HOMEM SÉRIO



Novo e curioso estudo dos irmãos Coen sobre o absurdo da condição humana, o seu sereno formalismo para explorar uma narrativa freneticamente surrealista torna-o numa das obras mais originais do ano. Impecavelmente filmado, arranca um fabuloso registo de contenção e desespero latente de Michael Stuhlbarg e o seu final ambíguo é susceptível de mais prazer que frustração cinéfila.




CANINO



Este foi, definitivamente, o principal "OVNI" cinematográfico a estrear no nosso país. Reconstituindo temas clássicos que vão desde a história de Adão e Eva até à Alegoria da Caverna (e estas são algumas das interpretações possíveis), a sua peculiar apresentação de condicionamento e livre arbítrio humano tanto pode ser visto como terror absurdo ou comédia atroz. Certo é ser dos filmes mais originais e exigentes do ano.




O ESCRITOR FANTASMA



Um thriller como já não se produz nos dias que correm, Roman Polanski colmata a ausência de explosões ou sustos construindo a sua ameaçante imagem de marca, apostando na contenção de personagens (um elenco formidável), ambiências hostis (nem a Natureza é apaziguadora) e uma economia narrativa (veja-se como um GPS "ajuda" ao desenrolar dos acontecimentos) que poucos alcançam. O cinema clássico puro está vivo!



Concordam? Discordam? Façam-se ouvir!

domingo, dezembro 05, 2010

European Film Awards 2010 — Vencedores



Aparentemente "deslocado" de tudo o que é prémio cinematográfico relativo a 2010, O ESCRITOR FANTASMA acabou por ser o vencedor surpresa durante a atribuição, ontem à noite, dos European Film Awards, arrecadando seis estatuetas. Roman Polanski, figura do ano pela sua contínua atribulação com a justiça e que, por isso, não se deslocou à cerimónia em Tallin, proferiu a sua declaração de agradecimento via Skype.

Outro filme em destaque foi LÍBANO, de Samuel Maoz, que recebeu o Prémio FIPRESCI, e Bruno Ganz foi o escolhido para a Homenagem de Carreira.

Assim, os vencedores das principais categorias foram:

Melhor Filme Europeu

O ESCRITOR FANTASMA, de Roman Polanski



Melhor Realizador Europeu

Roman Polanski, por O ESCRITOR FANTASMA



Melhor Actor Europeu

Ewan McGregor, por O ESCRITOR FANTASMA



Melhor Actriz Europeia

Sylvie Testud, por LOURDES



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A lista detalhada dos vencedores pode ser consultada neste endereço.

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